28 de julho de 2015 | N° 18240
ARTIGOS - MARIA BERENICE DIAS*
CUIDAR É PRECISO. ABUSAR É PROIBIDO,
Todo o Rio Grande chorou ao ler as reportagens sobre os maus- tratos cometidos contra crianças e adolescentes por quem deveria cuidá-los e protegê-los (ZH de 26 e 27/7).
Não há como não se sensibilizar com a verdade escancarada, de maneira nua e crua, do que acontece nos abrigos, que, como o próprio nome diz, deveriam abrigar, acolher.
Quem lá está depositado já passou por situação de negligência, maus-tratos, violência física ou abuso sexual. Ou tudo isso junto.
Foram retirados do lar – que deveria ser um lugar de proteção – para serem cuidados pelo Estado. Não são.
Claro que, diante de tudo o que passam, anos a fio, não é difícil entender por que, ao serem adotados, acabam testando quem os acolhe. Afinal, foram inúmeras vezes traídos pelas pessoas nas quais confiaram: primeiro, os pais e, depois, os chamados “educadores”. Quem sabe não é esta a origem de algumas devoluções que acontecem, o que, é claro, gera mais traumas e a crença de que se tornaram um verdadeiro estorvo social.
Na reportagem chama a atenção a história de José. Foi institucionalizado aos quatro anos por ter sido abusado sexualmente pelo companheiro da avó. Por que não foi imediatamente disponibilizado à adoção? O que levou o Estado a permitir que lá permanecesse até a adolescência?
Acabou sendo encaminhado à internação psiquiátrica por apresentar depressão, automutilação e ingestão de substâncias não alimentares. Durante anos continuou sendo abusado, inclusive depois que se encontrava hospitalizado, oportunidade em que denunciou os abusos de que foi vítima.
Às claras, que situações como esta, e todas as demais retratadas nas reportagens, não podem se perpetuar. É necessário que o Estado assuma a responsabilidade de garantir a crianças e adolescentes o direito à convivência familiar, que lhes é assegurado constitucionalmente.
Não é buscando de maneira negligente e morosa a reinserção na família biológica ou tentando encontrar alguém da família extensa e que, muitas vezes, sequer a criança conhece, para só então ter início o processo de destituição do poder familiar.
*Advogada, vice-presidente do Ibdfam