
OPINIÃO DA RBS
Mal amanhecia ontem e a reportagem da Rádio Gaúcha, no bairro Mathias Velho, em Canoas, ouvia moradores desolados com as casas novamente alagadas. O relato da aposentada Noeli de Abreu resumia o drama das famílias da região. A água voltou a estragar os seus bens. Desta vez, arruinou o que ela conseguiu readquirir para repor o que foi perdido após a enchente do ano passado. "Vai tudo fora de novo", lamentou.
Os alagamentos que ocorreram em Canoas, em outros municípios da região metropolitana de Porto Alegre e em bairros da zona norte da Capital, espalhando aflição entre os moradores, refletem apenas uma das muitas fragilidades escancaradas pela nova ocorrência de precipitações volumosas no Estado. Neste caso, os prejuízos e transtornos não foram ocasionados pelo transbordamento de rios, mas pela água da chuva que não consegue escoar de forma adequada devido à insuficiência dos sistemas de drenagem urbana.
Trata-se de uma vulnerabilidade crônica de áreas baixas densamente povoadas na Grande Porto Alegre, à espera de solução. Após a tragédia de maio de 2024, foi anunciado investimento federal de R$ 6,5 bilhões em drenagem urbana em 38 municípios gaúchos, sendo R$ 770 milhões para a Capital. Tocar essas obras seria atribuição das prefeituras e do Estado.
Projetos do gênero, mesmo que tenham agilidade incomum, demoram. Tanto pela complexidade como pela burocracia estatal. Ainda que seja preciso cobrar toda a celeridade possível, não é prudente aguardar apenas por um sistema de drenagem ajustado à nova realidade climática para evitar alagamentos e outros tipos de perdas financeiras e contratempos causados por chuvaradas. Precipitações acima da média não devem ser mais vistas como algo surpreendente.
A solução perdurável depende de um despertar definitivo sobre a responsabilidade compartilhada entre gestores públicos, legisladores, componentes do sistema de Justiça e cidadãos. Os alagamentos pela chuva também têm como causa o descaso da própria população com o descarte inapropriado de lixo, que acaba entupindo bocas de lobo e bueiros. Contribuem, claro, o serviço deficiente de coleta de resíduos domésticos e a falta de manutenção adequada da rede pluvial.
As mudanças climáticas são incontroversas e as tarefas de mitigação de seus efeitos, de prevenção de seus impactos e de adaptação precisam ser divididas.
Aos cidadãos cabe dar o exemplo por meio de atitudes cotidianas, consumo consciente, voto refletido e pressão nos representantes eleitos. Dos gestores aguarda-se empenho na entrega das tão faladas obras estruturantes. Do sistema de Justiça espera-se apego ao princípio constitucional de que "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida".
Dos legisladores, nos três níveis federativos, se requer prudência e compromisso com as futuras gerações ao serem analisadas propostas que levem a mais degradação ambiental. É preciso cada um fazer a sua parte para não serem eternos os episódios como os que levam famílias humildes a terem as casas invadidas pelas águas e a assistirem resignadas a uma nova perda de seus parcos pertences.
Nenhum comentário:
Postar um comentário