
27 de Junho de 2025
OPINIÃO RBS
Um Congresso de desaforos reiterados
O Congresso não cansa de demonstrar despudor quando estão em jogo os interesses dos próprios parlamentares ou aparece uma chance de ampliar vantagens para a classe política. Enquanto isso, o enfrentamento de entraves estruturais que freiam o desenvolvimento do país são relegados a segundo plano. O mais recente exemplo de desfaçatez teve novo capítulo na quarta-feira à noite, quando o Senado, afinado com a Câmara, aprovou o aumento do número de deputados federais, de 513 para 531, a partir de 2027.
Embora os senadores tenham alterado o texto votado pela Câmara, com emendas que reduzem o impacto financeiro, mas apenas na próxima legislatura, haverá aumento de gastos. Tanto diretos, pelos salários dos novos deputados, quanto pelo efeito cascata. A consequência imediata da decisão corporativa do Congresso será o inchaço também de nove Assembleias Legislativas, com mais 30 vagas estaduais. Estima-se que, no total, os contribuintes arcarão com R$ 95 milhões extras ao ano.
A janela de oportunidade para a Câmara se abriu por uma exigência do Supremo Tribunal Federal (STF) para o Congresso votar, até o dia 30 de junho, uma lei acerca da redistribuição das vagas, para ficar de acordo com a nova proporção do número de habitantes em cada Estado demonstrada pelo Censo Demográfico de 2022. Trata-se de um ajuste previsto pela Constituição, mas desconsiderado pelo Legislativo por duas décadas. O certo seria manter os 513 deputados atuais, com alguns Estados ganhando representantes, pelo crescimento maior da população, e outros perdendo. O Rio Grande do Sul, por exemplo, passaria a ter 30 eleitos na Câmara, um a menos. Se era o correto, paciência.
Mas um grupo significativo de deputados, em um movimento maroto, embarcou no projeto de lei apresentado pela deputada Dani Cunha (União-RJ) - filha do ex-presidente da Casa Eduardo Cunha, de más lembranças - que propôs a interpretação malandra de refazer a proporção correta sem que ninguém perdesse e alguns ganhassem. Foi aprovado em maio pelos deputados e, após a votação no Senado, retornou à Câmara ainda na quarta-feira, ratificado em apreciação a jato. A matéria vai agora à análise do Executivo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem o dever moral de vetá-la, mesmo certo de que a negativa será derrubada no Congresso.
Ainda que o Senado tenha reduzido os gastos com cota parlamentar, passagens e verba de gabinete, não está claro o que ocorrerá com as emendas parlamentares. Levando-se em consideração o histórico recente, é crível que surja pressão para elevar as verbas distribuídas pelos parlamentares, que só neste ano chegam a indecentes R$ 50 bilhões.
Mesmo despropositada, não surpreende a decisão de aumentar a quantia de deputados, a despeito da ampla rejeição da sociedade captada por institutos de pesquisa. Está em linha com outras deliberações nos últimos anos que tratam de temas de interesse dos próprios parlamentares e seus partidos. O Congresso brasileiro, já apontado por levantamentos internacionais como o segundo mais caro do mundo, confirma os motivos pelos quais é bastante mal avaliado pela população, apesar de ser fruto das urnas. Mudar esse quadro de desaforos reiterados depende da consciência do eleitor. _
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