
30 de Junho de 2025
CLÁUDIA LAITANO
Farinhada
"Se farinha fosse americana, mandioca importada, banquete de bacana era farinhada." O Ministério das Informações Aleatórias adverte: quem assiste a Pablo & Luisão nunca mais se livra do refrão da música Nóis é jeca, mais é jóia.
A abertura ao som de Juraildes da Cruz, compositor natural do Tocantins, é apenas um dos acertos da série que estreia na TV aberta na próxima segunda-feira, depois de se tornar um dos programas mais assistidos da Globoplay nas últimas semanas. A farinhada do Tocantins nunca foi tão bacana - e tão comentada nas redes sociais.
O talento para fazer o brasileiro rir alto diante da TV parecia ter evaporado com a segmentação dos públicos e a batalha cada vez mais acirrada entre identidades políticas divergentes. Espalhado por todas as plataformas e customizado ao gosto do freguês, o humor fragmentou-se em subcategorias social e culturalmente determinadas. Pablo & Luisão nos lembra que houve um tempo em que todo mundo achava graça das mesmas piadas. É mentira, Terta?
O primeiro acerto da série criada por Paulo Vieira a partir de histórias da própria família foi a escolha do elenco central: Dira Paes, Aílton Graça e Otávio Muller. O formato, com Paulo Vieira entrando em cena, participações especiais e comentários das pessoas reais que inspiraram os personagens, dá ritmo e evita que a série fique com cara de novela.
A ideia de celebrar a amizade masculina também veio a calhar em um momento em que virou moda falar da solidão do homem de meia-idade (fica a dica para rapazes de todas as idades: ame seu melhor amigo como Pablo e Luisão se amam). E o fato de a trama se passar no Tocantins, um Estado que raramente é retratado na televisão, acrescenta um tempero a mais.
Levando-se tudo isso em conta, ainda acho que a grande sacada da série é lançar um olhar amoroso sobre um talento nacional que em geral nos envergonha: a gambiarra doméstica. Se a gente acha engraçado ver alguém usando um cabo de vassoura para tentar segurar uma porta ou puxando um fio para improvisar uma ligação elétrica irregular (a prática que deu origem à gíria "gambiarra", aliás, é tema do primeiro e mais engraçado episódio da série) é porque todo mundo tem um mestre da enjambração na família. Alguém que transforma a precariedade em motor da criação - quase sempre com a melhor das intenções.
É essa mesma criatividade instantânea e indomável, muitas vezes temerária, que faz a gente pensar que se meme fosse tecnologia, o Brasil já estaria dominando o mundo - e banquete de bacana era farinhada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário