Jaime
Cimenti
Abril de 1964
Tinha
dez anos, morava em Bento Gonçalves, a melhor cidade, onde tive a graça de
nascer. Cursava o quarto ano primário numa escola cujo prédio fora construído
pelo Brizola, que, aliás, tinha levantado mais de seis mil. Naquela época, como
disse o Quintana, eu não entendia nada da questão social, apenas fazia parte
dela.
Estava
mais interessado nos estudos, em jogar bola de gude e futebol, degustar sopa de
capeletti e traçar galeto com radicci e polenta. No início de abril de 1964 a professora, logo ao entrar,
disse, fervorosa, para nos dar esperanças e alegria, que deveríamos agradecer a
Deus por sermos brasileiros, que estávamos livres dos totalitarimos do
comunismo, que seríamos felizes e poderíamos fazer nossas escolhas numa
democracia.
Fiquei
feliz, patriótico, sonhador, éramos bicampeões mundiais de futebol e vivia em
Bento, onde vi a luz do sol pela primeira vez e onde moram as melhores lembranças.
O golpe deu no que deu. Fiz parte da “geração amordaçada”.
Em 1967,
morava em Porto Alegre e estudava no Julinho. Participei de passeata, no
Centro, pedindo mais pão, menos canhão e protestando contra a falta de
liberdade e contra o acordo MEC-Usaid. Algumas pessoas se refugiaram na
Catedral Metropolitana, onde a Brigada Militar entrou.
O
cardeal Vicente Scherer controlou a situação. Em 1974, ingressei no Direito da
Ufrgs e o general Geisel na Presidência. General Golbery, abertura lenta e
gradual e tal, a gente foi levando. Felizmente, veio o movimento Diretas Já. Dia
13 de abril de 1984, eu e mais todas as torcidas fomos para a frente da
prefeitura de Porto Alegre pedir eleições.
Tancredo,
coração de estudante, lágrimas e Sarney, vá lá. Planos econômicos, inflação,
Collor, Itamar, Plano Real (a maior conquista popular de nossa História), FHC,
Lula e Dilma. Como disse o Tom Jobim, o Brasil não é para amadores e, falou o
João Cabral de Melo Neto, o parto de nosso País é demorado. Entendo um pouco da
questão social.
Apesar
de tudo e de muitos, tenho que acreditar que a frase “O Brasil é o país do
futuro e sempre será” é coisa do passado. O futuro chegou. Democracia, reforma
política, mais controle de gastos públicos, mais escolas, metrôs e hospitais;
menos corrupção, verbas públicas no futebol e impunidade. Mais federação, mais
Brasil, menos Brasília.