09
de abril de 2014 | N° 17758
MARTHA
MEDEIROS
Inclusão
Entre
os 45 mil presentes na cerimônia de reabertura do Beira-Rio no último sábado,
lá estava eu, emocionada com a sensação coletiva de “volta ao lar”. Vivi
intensamente os anos 70 do clube e seus três títulos incendiários. Era uma
colorada praticante, de ir ao estádio em todos os jogos. Depois diminuí a
frequência, até que deixei de ir.
Passei
a assistir apenas às finais de campeonato, e ainda assim pela TV. A última vez
que eu estive no Beira-Rio havia sido para assistir ao show do Paul McCartney.
E o evento de agora não foi muito diferente. Aquele 7 de novembro de 2010 em que
revivi minha paixão pelos Beatles teve o mesmo espírito deste 5 de abril de
2014 em que revivi outra forte paixão da adolescência.
Saudosismo
não é doença geriátrica, e sim uma confirmação da nossa consistência emocional.
Mas não é sobre isso que quero falar, e sim sobre a importância de milhares de
pessoas reunirem-se num mesmo local, com a mesma finalidade. Muita gente se
assusta com conglomerações, a ponto de evitá-las. Tem até um nome para isso:
agorafobia.
Pânico
de estar num espaço público cercado de gente desconhecida. Mas quem vence esse
medo recebe em troca uma energia que elimina qualquer desconfiança. Essa “gente
desconhecida” faz parte de uma mesma família. O DNA não é o mesmo, mas a pulsão
afetiva é direcionada para um mesmo objeto de culto, que pode ser uma banda, um
esporte, uma ideologia. Ter interesses em comum com os outros dá uma arejada no
egocentrismo.
Podemos
ter algumas neuras particulares (neuras, aqui, funcionando como nome carinhoso
para nossas manias, não necessariamente uma patologia séria) e isso nos impelir
a uma vida mais reservada, mas sempre que radicalizamos na autoexclusão,
acabamos por empobrecer a nossa história: é preciso compartilhar as alegrias
para fortalecê-las. Por isso, são tão essenciais os encontros entre amigos, as
festas de aniversário, tudo o que interrompe a monotonia do cotidiano a fim de
celebrar quem fomos ontem e quem somos hoje, valorizando os sucessos e
fracassos adquiridos pelo caminho – tudo o que nos constitui.
Vale
para pequenos eventos particulares e grandes eventos públicos. Sair de casa
vestindo uma mesma camiseta, de uma mesma cor e com um mesmo propósito é uma
forma de deixarmos nosso narcisismo em casa para fazer parte de algo maior,
algo que existe além de nós, ainda que nosso também: aquilo que nos representa.
Os
que sofrem de agorafobia ou qualquer outra fobia que impossibilite a união com
outros do mesmo time (seja esse “time” o do rock, o do surfe, o da moda, o da
política, o do futebol, o do ciclismo), tratem-se, curem-se e se abram para o
pertencimento. Não existe solidão que resista a uma voltinha para longe do
próprio umbigo.