28
de dezembro de 2014 | N° 18026
MARTHA
MEDEIROS
Espero que 2015 não seja
100%
Que tudo que eu quero que aconteça não aconteça
exatamente como imagino. Que eu consiga realizar meus projetos, mas que depare
com pequenas dificuldades para continuar duvidando de mim mesma. Que me surjam
ideias novas para abastecer minhas colunas, e também muitos dias de branco na
cabeça para eu saber que meu cérebro nem sempre obedece aos meus comandos. Que
meu trabalho atinja uma eficiência de 70% e me reste 30% de desacertos para não
perder a humildade.
Uma
amiga me desejou uma paixão que me tire o tino, me faça cambalear pela sala,
que me deixe maluca, abobalhada, sonhadora, acreditando em fadas e duendes.
Francamente, isso se deseja aos inimigos. Troco essa epifania por um amor que
atinja a meta de 80%, o que já é uma megassena. Que seja vibrante, sim, mas que
nos mantenha com os pés no chão, conscientes de que o paraíso emocional não
existe, mas pode-se chegar bem perto e será o bastante.
Que
haja uma porcentagem mínima de ciúme e desacordos, para que a segurança não
seja total e se queira continuar junto dia após dia, a fim de alcançar o
inalcançável. Que sobre 20% de solidão, aquela solidão necessária mesmo quando
estamos apaixonados, aquela solidão que fortifica a alma e que serve também,
entre outras coisas, para valorizar nossos vínculos.
Que
minhas amigas estejam por perto, mas não 100%, porque gosto de ter novidades
para contar quando nos encontramos. Que minhas filhas estejam por perto, mas
não 100%, não porque eu não queira, mas porque eu espero que elas não queiram,
ou não seriam garotas antenadas e saudáveis – que jovem adulto não sonha em
aventurar-se em seus próprios caminhos? Que minha família de origem – pais,
irmão, cunhada, sobrinhos – esteja por perto, mas não 100%, para que
continuemos a viver em harmonia (mas vou continuar falando contigo todos os
dias, mãe, prometo).
Saúde
de atleta? Também não. Em relação à saúde corporal, fecho negócio em 95% pra
mim e 5% para o oponente, a serem distribuídos entre espirros (pra lembrar que
o corpo se queixa), febrículas (pela transgressão de cair de cama no meio da
tarde) e dor de cabeça na manhã seguinte a alguma farra. E deu. 5% de
vulnerabilidade são suficientes para me manter alerta, fazer exercícios
constantes e abandonar o vinho depois do segundo cálice. Ou do terceiro.
Quanto
à saúde mental, fico com 50% sem achar que é pouco. Nem pensar em 100% de
certezas, teorias, eloquências. Nem pensar – mesmo. Menos pensar e mais agir,
mais impulsos, mais riscos. Estou topando dividir minha sensatez com
especulações, atrevimentos e algumas fantasias ordinárias.
A
vida não é impecável, por que eu seria? Em 2015, não almejo o absoluto, o
total, o 100% concluído. Que sobre espaço a preencher para me manter em
movimento. Feliz ano novo e incompleto pra você também.