segunda-feira, 10 de agosto de 2015



10 de agosto de 2015 | N° 18254 
L. F. VERISSIMO

Os sinos de Ouro Preto


Contam que só uma igreja de Ouro Preto anunciou a morte do Tiradentes com o toque fúnebre dos seus sinos. Todas as outras saudaram a execução do danado com um toque festivo. Não se conhece a explicação para os solitários sinos destoantes de Ouro Preto. Talvez o pároco da igreja enxergasse mais longe do que os outros e previsse que a História transformaria o réprobo em herói. Talvez o pároco fosse um admirador dos inconfidentes, sem medo de afrontar a Coroa com o toque lamentoso. Ou talvez o sineiro da igreja tivesse apenas se enganado e escolhido o toque errado. Não se sabe.

Como não se sabe – ou eu não sei – que santo dava nome à igreja. Se a história dos sinos é real, ele poderia ser uma espécie de padroeiro dos que resistem a julgamentos apressados e preferem ver quem, no longo prazo – a “longue durée” do historiador Fernand Braudel –, continuará réprobo e quem virará herói. O único problema com esperar o julgamento da História é que o longo prazo geralmente redime quem não está mais vivo para festejar sua reabilitação. O longo prazo custa a passar.

A longo prazo, uma verdadeira “loooongue durée”, o que se saberá deste período da nossa História sem a distração das badaladas e das paixões do momento, com o perdão da literatice? Para não ir muito longe no tempo, comecemos pela carta de suicida do Getúlio. Desde então, entre tudo o que aconteceu e deixou de acontecer no Brasil, tivemos repetidas tentativas frustradas de livrar o Brasil das tais forças ocultas e escancaradas, de fora e de dentro do país, que só se transformaram em folclore da esquerda porque nunca puderam ser denunciadas com clareza e consequência. 

Independentemente do que se pensa do desastre Jango, sua destituição por militares brasileiros com apoio americano e do patriciado nacional significa mais, para o longo prazo, do que sua breve passagem pelo poder. Independentemente do que se pensa da atual agonia do PT, se ele também está se suicidando ou sendo assassinado, o fato é que se trata de mais uma tentativa frustrada.

Não pergunte por quem dobravam os sinos prescientes de Ouro Preto. Dobravam por nós. Continuam dobrando.