sábado, 5 de abril de 2014


05 de abril de 2014 | N° 17754
NÍLSON SOUZA

À futura jornalista

A menina dos meus olhos está completando 21 anos hoje. Durante esse período, frequentou várias vezes este espaço como personagem e inspiração. Quem tem uma criança por perto não precisa garimpar assunto para escrever. Por isso, procurei compartilhar com minhas leitoras e meus leitores sabatinos alguns dos momentos divertidos ou encantadores de sua infância e muitas das suas descobertas adolescentes, sempre preservando sua identidade da exposição desnecessária e da evidência enganosa.

Anônima, mas real, ela iluminou as entrelinhas dos meus textos e talvez tenha levado alguns leitores a identificar o mesmo deslumbramento nas crianças de suas famílias. Se conseguimos isso, acho que valeu a pena. Foi uma bênção ter tido a oportunidade de acompanhar as principais etapas do desenvolvimento desta afilhada tardia. Ela estava no meu colo quando viu, com seus olhos verdes arregalados de espanto, a primeira chuva de granizo de sua vida. Ainda recordo com nitidez a sua expressão de surpresa.

Era ela, porém, que me surpreendia seguidamente, como nas ocasiões em que insistia para chegar muito cedo à pré-escola, antes das outras crianças da sua turma. Até o dia em que descobri o motivo desta estranha pontualidade: o primeiro aluno da fila tinha o direito de segurar a mão da professora no curto trajeto do pátio para a sala de aula. Senti até um certo ciuminho da mestra homenageada.

Mas a minha homenagem também estava reservada naquela cabecinha loira e inquieta. A menina cresceu e escolheu o meu ofício como caminho para o futuro. Forma-se em Jornalismo neste ano. Juro que nunca tentei influenciá-la, não apenas porque seus pais exercem outras atividades, mas também porque ninguém sabe que rumo tomará a profissão de informar e opinar nestes novos tempos em que cada indivíduo é uma mídia. Mas escolheu, livremente, e agora só me resta desejar que a exerça com amor e dignidade.


Sei, por experiência própria, que terá de enfrentar chuvas de pedra e gelo para conquistar o seu lugar ao sol. Espero que mantenha sempre o mesmo olhar de curiosidade da infância, pois é ele que alimenta o nosso ofício. Almejo, também, que incorpore na sua rotina princípios morais e éticos que não são exclusivos da nossa profissão, mas que são indispensáveis para o seu exercício: foco no interesse público, responsabilidade social, respeito às diferenças, compromisso com a liberdade e com o humanismo, apreço incondicional à verdade, cuidado na apuração e na divulgação de fatos, coragem para enfrentar contrariedades nos acertos e para pedir desculpas nos erros, e paixão em tempo integral pelo Jornalismo.