01 de junho de 2014 | N°
17815
FABRICIO CARPINEJAR
A mão da filha
Rituais me comovem. E ainda mais
quando são desnecessários.
Um deles é quando o jovem pede a
filha em namoro para os pais.
Ninguém usa cerimônia para
começar um relacionamento. Namoros se iniciam com um clique no Facebook e
terminam com o bloqueio no Facebook.
Por isso me espanta quem enfrenta
a família da pretendente. Quem se importa com a opinião dos mais velhos, em
empenhar a palavra, em olhar nos olhos, em indicar firmeza de laços.
Não é tarefa pequena criar um
compromisso com o futuro, transparecer intenções sérias, evidenciar que não
está brincando, admitir que está apaixonado e arcar com as consequências da
escolha.
Há uma tendência em ser
imediatista e descomprometido, em privilegiar o presente e a independência do
desejo. É cômodo manter o romance a dois, qualquer ruptura não terá efeitos
públicos, é sair e se desligar com facilidade. Os segredos ficam restritos e
não interessa aos demais.
Sou absolutamente sentimental com
a coragem dos românticos.
O adolescente que rompe com o
egoísmo e divide suas expectativas é um louco de minha mais completa admiração.
Olha que coisa estranha de se dizer: loucura hoje é ser tradicional, é se
apegar, é honrar o núcleo familiar, é oficializar o arrebatamento.
Quem pede em namoro diante da
família não pode fugir de repente, mudar de ideia e desaparecer. Declara o
endereço de seu coração, o CEP, o CPF, mostra quem é e o que deseja.
Quem tem essa ousadia de não
voltar atrás em seus próprios sentimentos e honrar promessas? De se incomodar
em ouvir o que os outros pensam, em suportar o constrangimento do primeiro
encontro e a secura da garganta?
Ficar na sala aguardando o
momento certo de abrir a boca entre o comercial e a novela. Escolher as frases
mais sensatas e tentar encontrar clareza para expor pensamentos confusos e
emaranhados da paixão.
E não é somente falar, é estar
receptivo a um sermão, a uma negativa, a restrições, a represálias. É se
colocar dentro de um convívio, com regras e ritmo desconhecidos.
Mais do que educação, significa
respeito. É cuidar daqueles que cuidaram dela antes. É proteger aqueles que
dedicaram a vida a protegê-la.
É valorizar o passado da mulher,
abrir um novo ciclo e arcar com as expectativas dos atos.
É avisar a família antes do mundo
— quer uma prova maior de reverência?
Meu amigo Claiton teve essa
dádiva. Quando o rapaz pediu sua filha em namoro, ele baqueou pelo
reconhecimento, surpreendido pelo tamanho cuidado.
Recebeu o candidato para um café.
Aguardou que ele falasse, falasse, falasse de toda sua fé e o quanto estava
sendo feliz.
Assim que ele pediu a mão de sua
filha, Claiton não facilitou. Emudeceu longos minutos. Encarou ambos, respirou
fundo e confessou:
– Não lhe dou a mão de minha
filha, deixa a mão comigo, tá? Você já tem todo o corpo e alma dela, a mão é
minha. A mão é do pai se ela precisar voltar, se ela precisar que eu a puxe de
volta. Combinado?
Quando o homem faz um pedido
formal de namoro, ele oferece algo muito importante e inesquecível à sua
namorada: a declaração de amor do pai.