quarta-feira, 28 de maio de 2014


28 de maio de 2014 | N° 17810
MARTHA MEDEIROS

Ídolos, uma ilusão de óptica

Certa vez, uma moça comentou comigo sobre a frustração que havia tido. Ela estava num bar em São Paulo com o namorado, quando encontraram um amigo deste, acompanhado de um ator do time dos bonitões da Globo. Ela se beliscou, mas não era sonho. Estava acontecendo. Pra resumir a história, acabaram os quatro na mesma mesa, em função da superlotação do local.

Ela jurou que teria uma noite memorável, e de certa forma teve, mas não exatamente como imaginava. Antes do segundo chope, já estava odiando seu ídolo. Segundo ela, o ator foi grosseiro com o garçom, blasé com uma senhora que o cumprimentou pelo trabalho, não se fixava no que o grupo estava conversando, parecia que estava atrasado para um compromisso bem longe dali.

Quando eu já estava duvidando da história, ela ainda arrematou dizendo que, quando a conta chegou, ele se fez de desentendido. “Será que achou que nós pagaríamos para ele só pela honra de termos sua excelência à mesa?” O ator pagou sua parte, mas o estrago já estava feito: havia perdido uma fã para sempre.

Conclusão dela: “Ídolos, melhor não conhecer de perto. É desencanto na certa”.

Não foi a primeira vez que escutei essa frase. Muita gente prefere manter o mito na cabeça a descobrir que galãs têm seus dias de mau humor como qualquer outra pessoa. E há que se considerar que a moça e o namorado podem ter sido uns malas – todos têm seu dia de mala também. E se passaram a noite fazendo perguntas indiscretas para o cara?

Sei lá.

Só sei que lembrei dessa história quando estive em Juiz de Fora dias atrás, participando de um evento literário. Lotação esgotada, aplausos, autógrafos – ufa, eu havia agradado. Porém, uma estudante se aproximou de mim ao final do bate-papo e me perguntou: posso ser sincera? Gelei. Prenúncio de bombardeio. Então ela disse que era a primeira vez que me via em público e que nunca imaginou que eu aparentasse ser tão... tão... comum (esperava ao menos, tipo assim, uma franja roxa). Disse também que estranhou quando revelei que preferia o dia à noite (cadê as olheiras?).

Que me achou muito afável (“artista que é artista não é simpático, me desculpe”), mas o que mais a impressionou é que eu houvesse sido casada por tanto tempo e que, não sendo mais, ainda desse crédito ao amor. Como assim? Então eu não era exótica, boêmia, vadia? Mas que ídolo de araque eu era, afinal?


Quanta decepção da menina sonhadora diante de uma reles mulher normal. Acabei com suas ilusões pitorescas sobre o estrelato. Quem dera, ela estivesse naquela mesa de bar em São Paulo, onde suas expectativas teriam sido atendidas. Eu deveria ter dito à garota que, às vezes, também pareço estar num lugar, mas não estou. Que de vez em quando me comporto como se estivesse atrasada para outro compromisso bem longe. E que isso também pode ser coisa de gente normal.