segunda-feira, 19 de maio de 2014


19 de maio de 2014 | N° 17801
EDITORIAL ZH

A ROTINA DA TRANSGRESSÃO

A recente greve da polícia militar em Pernambuco voltou a revelar uma faceta deplorável do país: bastou os organismos de segurança se ausentarem momentaneamente das ruas para que parcelas da população se sentissem autorizadas a enveredar para o crime. Divulgadas para todo o mundo, as cenas de saques a lojas e depredações de veí-culos, entre muitas outras demonstrações de transgressão à lei, comprometem a já desgastada imagem do país e suscitam algumas reflexões importantes.

Uma delas é o que levaria tantos brasileiros a se sentirem autorizados a agir de forma criminosa depredando prédios, saqueando lojas e incendiando ônibus, por exemplo simplesmente porque não estão sendo observados pelos policiais.

As imagens recentes que chocaram os brasileiros de boa formação não são uma exclusividade dos moradores de Recife e cidades vizinhas. Ainda no mês passado, uma greve dos policiais militares na Bahia deu margem, igualmente, a episódios semelhantes. Mudou apenas o foco dos saques, que de cerveja e pescados na época da Semana Santa, em Salvador, incluíram agora preferencialmente eletrodomésticos.

Em Recife e arredores, os vândalos chegaram a formar grupos para conseguir transportar produtos de maior porte, constrangendo e provocando natural indignação em quem tem um mínimo de princípios.

Em diferentes cidades do país – incluindo o Rio de Janeiro, constantemente às voltas com episódios de violência –, ausência de vigilância policial tem sido interpretada como autorização para os delinquentes. Infelizmente, muitas pessoas se deixam contaminar pela má conduta. Protegidas pelo anonimato, acabam engrossando as hordas de desordeiros.

Ora, o errado é errado, mesmo que todo mundo esteja fazendo. E o certo é certo, mesmo que ninguém esteja fazendo. Precisamos construir no país uma cultura de ética e cidadania, para que a própria população ajude a controlar os verdadeiros delinquentes.

O Estado brasileiro também contribui para fomentar desvios quando ajuda a reforçar a ideia de impunidade, deixando prosperar males como a criminalidade e a corrupção. O mesmo ocorre quando o poder público se mostra incapaz de assegurar um mínimo de segurança nas ruas, durante a greve de uma corporação que, pela relevância do serviço prestado, não deveria ter o direito de simplesmente cruzar os braços. Seja qual for o caso, porém, o limite a transgressões como depredações e apropriação indébita mediante violência não pode depender apenas de contenção policial.