22 de maio de 2014 | N°
17804
CARLOS GERBASE
DICAS DE PORTUGUÊS
Meu celular tocou, eu estava
muito atarefado, mas o número era de São Paulo (11) e achei que podia ser
importante. Atendi. Uma gravação me advertiu que eu tinha uma mensagem e
deveria apertar a tecla 1. Apertei. A voz de um certo professor me ofereceu
dicas de português a um preço módico. Desliguei, com vontade de dar apenas uma
dica para o professor. Imaginem que ele está segurando um celular. Daqueles
antigos, maiores. Agora imaginem minha dica. É isso mesmo.
O telemarketing está atingindo
níveis surreais de desrespeito e impunidade. Não, não quero ter informações
sobre o mais novo lançamento imobiliário. Não, não quero trocar meu atual plano
de telefonia celular. Não, não quero aproveitar as vantagens oferecidas pelo
meu fornecedor de TV por assinatura. Não, não quero autorizar pagamento algum
em débito automático. Não, não quero acessar qualquer novo conteúdo em site
cultural nem conhecer uma nova loja, nem fazer curso de inglês, nem trocar meu
perfil de investimentos... NÃO QUERO NADA!
Quero decidir minha própria vida.
Quero manter distância de publicidade invasiva. Aquela publicidade a que somos
obrigados a assistir quando pagamos entrada para ver um filme no cinema. Aquela
que torna os intervalos na TV paga insuportavelmente longos. Aquela que
desfigura a cidade com outdoors imensos e horrorosos. Aquela que invade nossos
celulares, nossas caixas de correspondência digital e nossas vidas sem pedir
licença e puxa conversa sobre como não pagar as multas de trânsito. Se isso não
é ilegal, não sei mais o que é.
Se a publicidade nos ajuda a
escolher o melhor produto, se ela pode ser criativa, defender boas causas,
atacar a intolerância, promover o debate político e fazer pensar, se tudo isso
é verdade, mesmo assim ela perde todos seus pontos ao me atacar covardemente.
Quando entro num site comercial, quando compro um jornal, quando ouço rádio,
quando assisto à TV aberta, estou automaticamente me colocando num espaço de
publicidade. Sei que ela está ali e posso conviver com ela. Posso até gostar
dela.
Meu problema é com gente
inescrupulosa, mal-educada e que ainda quer dar lições de português. Me deixem
escrever mal e errado! Se o professor me ligar outra vez, vou a São Paulo com
meu celular de 1993 pra dar a dica que ele merece ouvir e sentir.