sábado, 29 de novembro de 2014


30 de novembro de 2014 | N° 17999
ANTONIO PRATA

Direitos do Homem (sensível)

Se você é um ogro machista e homofóbico, você tem representantes no Congresso, na imprensa, tem vários amigos no clube. Se você é LGBT, você tem representantes no Congresso, na imprensa, tem vários clubes de amigos(as). Agora, se você está no meio do caminho, se é apenas um homem sensível lutando para ver respeitados certos direitos básicos de sua pacata heterossexualidade, não tem político a quem pedir socorro e periga não emplacar sequer reclamação na seção de cartas do jornal.

Que “direitos básicos” são esses? Ora, muitos, que viemos perdendo aos poucos, da adolescência pra cá, conforme nos apaixonávamos por mulheres inteligentes, elegantes e criteriosas, diante das quais, sensíveis que somos, fomos fazendo concessões. Usar regata, por exemplo: não pode. Calçar tênis de corrida, socialmente: nem pensar. Sair por aí, poxa vida, de pochete: divórcio.

A menção à regata, ao tênis de corrida e à pochete pode dar a impressão de que as reivindicações deste desassistido grupo pendem para a ogrice. De que nosso sonho é deixarmos de ser homens sensíveis e irmos nos transformando, paulatinamente, no Homer Simpson. Não é por aí. Alguns dos nossos anseios têm a ver com o Homer: outros têm a ver com a Marge – ou com a Lisa? Por exemplo: andar de patins. Pronto, falei.

Eu sempre quis andar de patins, mas nunca tive coragem de assumir esse desejo. Vejo as pessoas deslizando pelas ciclofaixas como se tivessem asas nos pés, posso sentir o vento batendo em meu rosto, soprando a brasa da inveja e acendendo um pensamento: nossa, se eu fosse gay ou sueco, eu comprava um patins hoje mesmo. Acontece que não sou. Sou apenas um rapaz latino-americano, um pobre-diabo espremido entre o feminismo e o machismo, o hífen solitário no meio do Fla-Flu, com medo de ir de moletom e chinelo à padaria e pôr em risco o meu casamento, com medo de saracotear sobre rodinhas e pôr em dúvida a minha masculinidade.

Fôssemos uns machistões, não haveria problema. Teríamos casado com mulheres frágeis e tolas, que só nos diriam “amém, meu bem” e nossa vida conjugal seria um eterno domingo de Rider e latão: “Mais salaminho, pitucão?”, “Sim, pituquim”. Mas não, nos apaixonamos pelas bisnetas da Simone de Beauvoir: aí, queridão, conseguir emplacar um Chapecoense x Criciúma como programa pra noite de quarta, fica difícil.

Fôssemos uns seres evoluídos, superiores às infantilidades latinas e libertos das amarras do gênero, não ligaríamos para as opiniões dos nossos pares: compraríamos os patins (reais e simbólicos) e sairíamos por aí, todos pimpões. Mas não, nós queremos ser vistos como mui machos, centroavantes, pegadores: aí, realmente, patins, fica difícil.


Difícil, mas não impossível. A união é o primeiro passo. A divulgação dos nossos anseios, iniciada aqui, é o segundo. O terceiro é elegermos um representante. Ou, quem sabe, conquistar o apoio de um já eleito? Será que o Jean Wyllys não se interessaria em defender a causa? Em ouvir nossas reivindicações e incorporar HS, as iniciais de “homem sensível”, à sigla da diversidade sexual: LGBTHS? Prometemos ajudar na luta por um mundo livre, onde cada um ame quem quiser, escolha o gênero em que se sentir mais à vontade e possa até, um dia, – por que não? – sair por aí de pochete.