13
de novembro de 2014 | N° 17982
PAULO
SANT’ANA
O esquecimento
Esse
dispositivo que possuímos, chamado memória, felizmente tem uma chave que o
desliga de si próprio.
Explico
melhor: quando a memória vai passar a ser nociva ao homem, ela própria se desliga.
Então,
pela memória, nós nos lembramos de tudo o que nos aconteceu. E rememoramos as
tristezas, as mágoas, os desenganos e até mesmo desgraças que sofremos.
No
entanto, se fôssemos remoer essas recordações chatas ou horríveis sobre nossas
vidas, se elas insistissem em nos maltratar, enlouqueceríamos.
Então,
a memória aciona maravilhosamente as nossas péssimas recordações para que elas
desapareçam e voltemos nossos pensamentos para outras recordações, não
agressivas.
Fiquei
assim, pensando, fascinado em saber que o ser humano é dotado do esquecimento,
em suma.
Se não
esquecêssemos, entraríamos em parafuso, imagino até que é assim que se origina
a loucura. Os pesadelos, por sinal, exercem o papel sinistro de nos arrancar do
esquecimento.
Por
isso é que, por vezes, nos acordamos durante a noite, sobressaltados,
assustados com o que sonhamos. Isso é o pesadelo. É nossa memória que driblou o
esquecimento, e o pesadelo nos assalta para que recordemos o que não queríamos mais
recordar.
Esquecer
o que é ruim é saudável. Esquecer o que é bom é, ao contrário, muito ruim para
nós. Quantas vezes ouvimos pessoas dizerem: “Aquilo caiu no esquecimento”. Se
aquilo que caiu no esquecimento era ruim, bom para quem esqueceu.
Mas
se aquilo que caiu no esquecimento era bom, então ruim isso se torna para quem
esqueceu.
Por
sinal, são comemorados os nossos aniversários para não esquecermos que estamos
vivos.
Quem
não comemora seus aniversários está querendo apagar da sua memória a sua existência
péssima. Se um dia voltar a comemorá-los, é porque renasceu para a vida.