segunda-feira, 1 de dezembro de 2014


01 de dezembro de 2014 | N° 18000
L. F. VERISSIMO

Bang!

A última do papa Francisco é que nem o Big Bang desmente a Teologia, nem a Teologia desmente o Big Bang. Um cristão pode aceitar a teoria do grande estouro que, segundo a ciência, deu origem ao Universo em um milésimo de segundo, sem abandonar sua crença na existência de um Deus criador de tudo. Pode-se até imaginar uma hipotética conversa do papa, que o representa na Terra, com Deus, em que Este lhe confidencia:

– Francisco...– Sim, Senhor. – O Big Bang... Existiu mesmo.

– O quê? – Existiu. Não adianta mais negar. A teoria está certa.

– O senhor tem certeza? – Meu filho, Eu estava lá. – Então o Big Bang... Foi o senhor?

– Modestamente...

A ciência não nos assegura que o Grande Nada que precedeu o Big Bang não fosse o tempo ocioso de Deus, indeciso sobre o que fazer da Sua vida. Crio um universo? Me resigno a esta imensa solidão, por toda a eternidade? E este meu poder sem limites, o que faço com ele? Se posso tudo, por que não fazer tudo? E Deus explodiu, criando tudo.

A vantagem de criacionistas sobre evolucionistas é que a Bíblia, onde está escrito tudo que um criacionista precisa saber, pode ser lida como verdade incontestável ou como uma coleção de parábolas e metáforas. Assim, trechos que parecem cientificamente improváveis são explicados como sendo em linguagem figurada, com liberdade poética, e os outros, menos fantásticos, como fatos históricos. Não há nem poesia nem certezas iguais nas explicações científicas.


Há pouco, uma sonda pousou num cometa e, entre as transmissões que mandou para a Terra, detectaram o que pareciam ser notas musicais. Não eram, mas, por um breve instante de encantamento, foi lembrada uma ideia antiga, a de um Universo sinfônico, e Deus como uma espécie de Beethoven sideral. O cometa traria, entranhado, algum resto da música das estrelas. Mas o ruído da sonda era só estática. Pena. Seria um ponto para o deslumbramento religioso contra a frieza da ciência.