quarta-feira, 24 de junho de 2015



24 de junho de 2015 | N° 18204 
MARTHA MEDEIROS

Um novo Brasil sobre os escombros

Ao dar um giro pelo planeta, descobre-se, por exemplo, que a maior atração turística de Mostar é uma ponte que foi reconstruída depois da guerra da Bósnia. Que Munique é deslumbrante mesmo tendo sido quase toda devastada por bombardeios durante a II Guerra Mundial. E que praticamente tudo o que o tsunami no norte do Japão arrasou, há apenas quatro anos, já está em pé de novo.

O ser humano é regenerador. Confiante nisso é que me sinto feliz com a situação atual do Brasil, este país sem terremotos, tsunamis, guerras ou desastres ambientais de grande magnitude, mas com uma canalhada de dar medo: se tudo se reconstrói e fica melhor, nós conseguiremos também.

Não temos templos com marcas de tiros de canhões nem ruínas de cidades dizimadas por antigas civilizações, mas aguardo um Museu da Corrupção em cada capital (o museu virtual existe, acesse muco.com.br), com fotos, documentos, gravações, tudo que comprove nossa devastação moral e que cumpra o dever de manter vivo o passado para que ele não seja repetido.

Foram muitos e muitos anos de um Brasil destruído pela ganância, muitos e muitos anos de um país que não se desenvolveu como deveria por causa dos ratos que corroeram as leis e impediram qualquer espécie de grandeza, muitos e muitos anos em que os traíras da nação foram mais danosos que os inimigos externos – aliás, nossos inimigos externos nunca foram páreo para os internos, os que aqui nasceram sem nenhum traço de honestidade. Nossa guerra foi dilacerante porque éramos nós contra nós mesmos.

E agora aí está. Empresários e políticos atrás das grades, a respeitabilidade reduzida a níveis subterrâneos e a consciência inquestionável de que este é um país que sempre foi surrupiado, lesado – quase nada poderia mesmo ter vingado diante de tanta falcatrua. Somos gatunos natos. Uns melhorzinhos que outros, mas os piorzinhos fazendo um estrago avassalador.

Rouba-se pouco e muito, rouba-se na esfera pública e privada, rouba-se do condomínio e da Receita Federal, rouba-se no troco e rouba-se no orçamento, rouba-se no leite, no queijo, na gasolina, no esporte, rouba-se de dia e de noite, com armas e com liminares, rouba-se com os pés descalços e de gravata, rouba-se de fiéis e de ateus, rouba-se por trás, de frente e de viés. Um dia isso iria eclodir. Quem precisa de Hiroshima, de bomba de napalm? Temos nosso próprio cogumelo de fumaça encobrindo a música, a natureza e a alegria que tão bem nos representavam até pouco tempo.

A boa notícia? Se tivermos sorte, essa devastação nos transformará finalmente em um país maduro, forte e ético. Basta que no futuro ninguém mais tolere que esta desgraça chamada corrupção volte a ser epidêmica.