30 de junho de 2015 | N° 18210
CARPINEJAR
Antes e depois do cofrinho
O homem renuncia seus títulos de nobreza quando mostra o
cofrinho.
Antes disso, ainda desfruta de chances de salvação e de
terapia. Existem na trajetória masculina dois períodos da cristandade no
casamento bem definidos: AC e DC.
No momento em que ele se agacha, na pose de mecânico distraído,
com a calça arriada e o fundilho aparecendo, acabaram suas pretensões estéticas.
Não há desculpa para a falta de cuidado. Inútil alegar que
estava arrumando o vazamento da cozinha ou procurando algo debaixo do sofá e não
contava com as mínimas condições para se preocupar com os detalhes.
É pecar uma vez que o demônio da preguiça assume o corpo. Após o vexame, o sujeito descerá a ladeira longe do trio elétrico.
Cultivará a barriga, esquecerá o cinto, deixará crescer pelo no nariz e na
orelha.
Será capaz de tudo: de sair na rua de abrigo rasgado, de
roupão, de pantufas, de chinelos da Bela Adormecida. Não arcará com mais nenhum
capricho e controle da aparência. Abandonou o time em campo.
Coitada de sua mulher. O próximo passo é usar calção sem cueca
e não perceber o que está dentro ou fora do forro. Expor o cofrinho é próprio de macho largado. Não terá mais
nenhuma vontade de agradar. Sacrificou o último estágio da censura e da decência.
Não se penitenciará pelas constantes porquices dentro de
casa. Confundirá intimidade com desleixo. Logo mais estará urinando de porta
escancarada, palitando os dentes de boca aberta, soltando flatulência na cama e
obrigando a sua companhia a cheirar junto debaixo do edredom e arrotando na
mesa para pedir aplauso.
Testemunhar seu parceiro de quatro é tristemente inesquecível,
que sempre pega a mulher desprevenida. Ela jamais percebe quando irá acontecer
para se preparar e se defender. Pode ser na frente de uma geladeira ou do armário.
A camiseta levanta subitamente, a calça cai e é tarde demais para fechar os
olhos e não gravar a porção indefinida entre glúteos e gordura.
O berço do ogro é o cofrinho. A paisagem desastrosa de um
traseiro desgovernado não provoca cumplicidade feminina, mas rejeição. E,
principalmente, desperta uma dupla pena, do homem na posição de Napoleão
perdendo a guerra e de si, por estar casada com ele e não ser nem uma Josefina
para ter um amante de respeito.