19
de junho de 2015 | N° 18199
MARCOS
PIANGERS
É tudo
verdade
Minha
filha apareceu esses dias com essa história, de um monstro chamado Beleléu. Aprendeu
na escola. O Beleléu é um monstro que rouba os brinquedos das crianças, caso
elas não arrumem as coisas depois de brincar. Imagino que esse era o objetivo,
e funcionou espetacularmente: minha filha não deixa mais nada espalhado na sala.
Nenhum jogo de tabuleiro no chão do quarto. Nenhum baralho da Frozen espalhado
embaixo do sofá. Nenhuma peça de lego posicionada estrategicamente pra eu pisar
quando estou descalço.
É um
upgrade considerável na nossa batalha diária de fazer a menina arrumar suas
coisas. Pensei até em inventar um monstro que pega crianças que não tomam banho.
Preciso de um monstro que roube a língua de quem não come todo o arroz com feijão.
Por favor, um monstro que deixa careca a criança que chora e dá vexame no meio
do shopping!
Pena
que não vai servir. Porque é mentira. Quer dizer, acho que é mentira. Nunca se
sabe. Mas, até onde eu sei, ela vai ter que arrumar os brinquedos porque é a
coisa certa a ser feita. Não por causa do Beleléu. E eu vou ter que convencê-la
a tomar banho e a comer e a dormir e a se comportar. Dá mais trabalho, mas é verdade.
Porque
quero que ela acredite em mim pra sempre. Quando eu disser que ela precisa me
dar a mão pra atravessar a rua. Ou que brócolis faz bem, apesar do gosto. E
vacina, apesar da dor. E que tenha cuidado com assaltantes. O mundo já está cheio
de monstros.
Evidentemente,
tenho alguns deslizes. Digo, às vezes, que ela é a menina mais linda do mundo. Não
conheço todas as meninas do mundo, mas acredito nisso. Eventualmente, digo que
ela é muito inteligente, que é incrível que ela conte até 10 aos três anos de
idade. Não tenho certeza, mas falo mesmo assim.
Minto
que, se ela comer toda a janta, vai ficar forte imediatamente. Ela, então,
mostra os bracinhos firmes depois de cada colherada. Digo que meu beijo tem o
poder de tirar a dor de qualquer machucado. E ela acredita. E realmente
funciona. Então, tenho certeza de que é tudo verdade. Se for pra acreditar em
uma lenda, que seja essa.