sábado, 13 de junho de 2015



14 de junho de 2015 | N° 18193
ANTONIO PRATA

Joanão e outras minifábulas

Um dia a joaninha tomou coragem, cobriu as costas com fita isolante, fez uma cara de túmulo e se juntou aos seus ídolos: a turma de besouros góticos que se reunia, toda noite, ao pé do cupinzeiro abandonado. “E aí, pessoal?”, ela murmurou, na voz mais deprimente que conseguiu. “Sai fora, joaninha!”, rosnou o líder dos besouros. “Que joaninha?! Eu sou um besouro pequeno, de outro tipo!”. “Ah, é? Então que que é isso?!”, perguntou o líder, arrancando a fita isolante. “Saco...

Beleza, mas ninguém me chama de joaninha, ok? Todo mundo me conhece como Joana”. “Nem vem, joaninha! Tem lugar p’cê aqui não, fofa!”. “Eu não sou fofa!”. “Ah, não? Vermelhinha com pintinhas pretas?! Parece um moranguinho alado!” – e todos os besouros góticos riram. “Moranguinho o escambau! Isso aqui é tipo, tipo um, um mar de sangue fresco cheio de besouro morto afogado depois que uma vaca com ebola sangrou pelos poros até cair morta e seca no pasto que nem uma uva passa!”.

Hoje, Joanão é líder dos besouros góticos, que passam horas, toda noite, pintando as costas com urucum – deixando intactas só algumas bolinhas pretas –, antes de se dirigirem ao cupinzeiro abandonado. 

Para os ácaros, não tem história mais apavorante do que Piolho, de Bram Stoker. 

– Tamanduá transformer! Tamanduá transformer! – grita a formiga sentinela, do alto da geladeira, ao que todas as outras correm para trás do espelho de luz, apavoradas com o aspirador de pó. 

A cobra verde cuspia uma, duas, três vezes e já ficava com a garganta seca, então se perguntava, “Nossa, como será que ela consegue?!”, admirando a mangueira do jardim. 

Há entre os tatus-bola uma antiga crença: depois de morrer, aqueles de vida proba viram bola de gude – já os maus passarão o resto da eternidade metamorfoseados em cocô de galinha. 

“Prova da superioridade das nozes sobre as amêndoas, as avelãs e as castanhas”, escreveu uma noz eugenista, em fins do século 19, “é que a natureza moldou as nozes tal qual o cérebro dos humanos – a segunda espécie mais evoluída, depois das nozes –, ao passo que as amêndoas, avelãs e castanhas se assemelham, quando muito, aos testículos dos supracitados bípedes”. 

Contra o eugenismo das nozes, em fins do século 19, uma jovem avelã escreveu: “Oh, mas que ideia malsã / Imagem de puro asco / Ânimo, bela avelã! / Noz é que parece um saco!” 

Enquanto tais embates se davam pelos salões e academias científicas, os amendoins, analfabetos, cruzavam oceanos nos bolsos dos marujos, rolavam pela grama, nas mãos das crianças, enchiam a cara de vinho, tabaco e perfume nas mesas dos cabarés.