terça-feira, 7 de outubro de 2014


07 de outubro de 2014 | N° 17945
LUÍS AUGUSTO FISCHER

OITO ANOS

Depois de amanhã, meu filho completa oito anos. Aos 56, eu vivo isso com uma intensidade que não sei descrever. Lembro dos meus oito anos, claro, muito tempo atrás: eu no terceiro ano primário, trocando de escola no meio do ano por mudança de endereço da família, indo para um colégio só de guris, com professores que chamavam a atenção dos rebeldes de modo agressivo.

Já o Benjamim está vivendo o aniversário num mundo muito distinto. Estudando em escola pública aqui em Paris, convive com colegas de muitas nacionalidades, numa turma que se dedica a auxiliar o aprendizado do francês por parte de crianças de outras línguas maternas – tem coreano, dinamarquês, polonês, ucraniano, outros brasileiros, até um nepalês, hipótese entre todas a mais remota para meu acanhado radar ocidental.

Ele tem se saído muito bem, como qualquer outra criança bem alimentada e estimulada se sairia. Tem gostado de medir as diferenças linguísticas, aprende palavras nas outras línguas, assim como ensina algumas em português – o Brasil tem bom cartaz hoje em dia. Está curtindo muito a matemática, bem puxada por aqui.

Dá gosto ver o que pode acontecer numa escola bem tratada, com professores bem pagos e bem formados (mas em regra muito mais duros e repressores do que no Brasil), num contexto positivo a que, por outro lado, não faltam as tensões da vida, mas em que abundam as boas condições, alicerçadas na condição pública, leiga, de qualidade.

(No Brasil, nós, das classes confortáveis, nem cogitamos submeter nossos filhos ao similar local, e com isso, bato no peito, indiretamente estimulamos a segregação social e deixamos para quem tem menos e quase sempre pode menos a dura tarefa de obter qualidade na educação.)


Já aprendi que as crianças aprendem de nós quando estamos distraídos, talvez mais do que quando deliberamos ensinar. Mesmo assim, penso em dizer explicitamente ao meu filhote tanta coisa. Digo uma só, então: vai lá, aprende como funciona este mundo, que teu velho pai fica aqui, na cobertura, como um centromédio das antigas.