28
de outubro de 2014 | N° 17966
FABRÍCIO
CARPINEJAR
Anão de jardim é o protetor do
casamento
Ela
me perguntou, séria e angustiada, o que tinha errado na relação. Acabara de se
separar depois de cinco anos de relacionamento.
Eu
pensei, pensei, pensei até que afirmei que sabia o motivo.
– O
quê? – ela me perguntou, muito ansiosa.
–
Lembra quando você ficou em dúvida na floricultura entre comprar um anão de
jardim e um flamingo para seu pátio?
–
Lembro. – Você levou o flamingo, o flamingo voa! Foi uma escolha errada.
–
Está de brincadeira! Não, não estava brincando. Os casais que compram um anão
de jardim dificilmente se separam.
Terão
uma resistência em desfazer a família, em provocar o divórcio, em se desligar
um do outro. Realizam uma homenagem à casa da avó, aos tempos imemoriais, em
que se casava uma vez para sempre. São apegados ao que é construído, adquirido
ao longo da convivência, em preservar o patrimônio afetivo.
Assim
como há placa advertindo da presença de cachorro perigoso no portão, o anão é
um aviso da longevidade e do pacto amoroso. Os infiéis e adúlteros devem manter
distância e passar longe.
Seus
moradores são caseiros, dedicados, persistentes. Ao encontrar espaço para o
anão, dispõem de terreno para cultivar a solidão de cada um e acolher filhos e
netos.
O
anão sacramenta o sonho de morar num lugar tranquilo para envelhecer com
alguém, tomar chimarrão na varanda e regar as flores ao final do dia.
Comprar
um anão de jardim é pôr uma pedra no futuro. É acreditar na proteção dos
santos, na superstição, na fé das plantas, nos contos de fada dos irmãos Grimm.
A
esposa será a Branca de Neve, o marido será o príncipe, eis a crença secreta de
quem põe um anão no jardim, mesmo sob o disfarce da zombaria ou do ceticismo. É
reavivar a vitória do beijo apaixonado sobre o sono da maçã envenenada.
Não
é fundamental possuir toda a trupe, formada por Mestre, Dengoso, Atchim, Feliz,
Dunga, Soneca e Zangado. Um de seus integrantes já assegura o benefício
romântico.
Se
Santo Antônio salva os encalhados, os anões recuperam os casados. O anão é
fiador emocional de uma linhagem longa, da descendência farta, da superação das
diferenças.
É
como contar com um guarda noturno vitalício nos canteiros, um serviço de
vigilância durante 24 horas. Não há nenhuma estatística que prove minha crença,
é fruto da observação.
Nenhum
casal que conheço desfez sua união após adquirir um anão de jardim. Nos
casamentos mais longos que já testemunhei, casualmente seus moradores tinham as
pequenas estátuas na entrada dos seus endereços.
Sady
e Heidi viveram 60 anos num casarão verde no centro de São Leopoldo, ornado de
anões e bromélias. Frederico e Natália completaram bodas de ouro numa
construção forrada de heras no bairro Chácara das Pedras, em Porto Alegre,
escoltados por três anões de jardim e oliveiras.
Só
não ponha o anão de jardim dentro de casa, que traz o efeito contrário e ele provoca
o divórcio e o barraco.