domingo, 5 de outubro de 2014

FERREIRA GULLAR

Somos todos responsáveis

Somos responsáveis por essa situação, já que os que governam e os que fazem leis foram eleitos por nós

A frequência com que critico o quadro político brasileiro --e especialmente a atuação de certos partidos e dirigentes-- pode fazer parecer que considero todos os políticos corruptos ou ineptos, mas não é assim.

Há muitos políticos honestos e, bem ou mal, o país caminha, muitas coisas melhoraram, apesar de que falta muito por fazer, falta muito para que se alcance o nível dos países avançados. Isso não se fará em apenas um governo, mas que pelo menos os problemas mais graves como saúde, educação, saneamento, sejam enfrentados com a necessária seriedade e não com intenções meramente eleitoreiras.

Por sua vez, o eleitor deve entender que se as questões básicas não são resolvidas, os problemas de todos tendem a se agravar.

Na verdade, não escrevo para que apenas os políticos leiam, pois certamente têm mais o que fazer. Escrevo, sobretudo, para que você, cidadão, me leia e reflita sobre o que digo e os erros que aponto. Não para que você simplesmente concorde comigo, mas, sim, para que, mesmo não concordando, reflita sobre essas questões e procure entendê-las.

Não alimento ilusões quanto à solução imediata dos graves problemas que dificultam o crescimento do país e menos ainda quanto ao atendimento das necessidades da população, particularmente das camadas mais pobres.

Não obstante, acho que muito pode ser feito e esse é o motivo que me leva a criticar os responsáveis, não apenas os membros do Executivo, mas igualmente dos dois outros poderes, o Legislativo e o Judiciário.

Alguns mais diretamente responsáveis pelo mau funcionamento da máquina do Estado, muito embora todos, de um modo ou de outro, tenham culpa nisso, seja por agir mal, seja por omitir-se diante dos abusos e dos erros.

Aliás, a rigor, todos nós somos responsáveis por essa situação lamentável, uma vez que tanto os que nos governam como os que fazem as leis foram eleitos por nós.

Um aspecto a observar, no Brasil, é o alto custo dos poderes da República. Esse pode ser um dos motivos de sua omissão quanto à destinação dos recursos públicos, uma vez que esses três poderes têm, aqui, um custo relativamente mais alto do que na maioria das nações, incluindo as mais ricas como os Estados Unidos, a Alemanha ou a Inglaterra.

Se o Senado brasileiro emprega cerca de 10 mil funcionários e cada deputado federal tem à sua disposição dezenas de funcionários --que nem em pé caberiam em seu gabinete--, se cada ministro do Supremo tem, para servi-lo, mais de 200 funcionários, é compreensível que de nenhum deles poderiam partir iniciativas para corrigir uma tão injusta destinação dos recursos públicos.

A conclusão inevitável é que os integrantes daqueles poderes constituem uma casta que se apropriou do Estado brasileiro e o usa conforme seus exclusivos interesses.

Pouco se lhes dá, portanto, se não há recursos suficientes para atender à população em suas necessidades básicas. Os hospitais públicos vivem abarrotados de pacientes, pelos corredores, à espera do atendimento médico que nem sempre chega a tempo.

No setor judiciário, conforme relatório recente, nada menos de 30 milhões de processos esperam julgamento, sendo que uma parte deles dizem respeito a interesses de cidadãos cuja vida, muitas vezes, depende dessas decisões.

Os gastos com educação estão muito abaixo do que seria necessário para atender à parte jovem da população que precisa estudar. Os políticos parecem não perceber que a educação é a base do desenvolvimento do país.

O que fazer então? Deixar tudo como está ou iniciar a luta pela mudança radical desse quadro? Se a opção for o conformismo --ou mudanças aparentes que caracterizam o populismo-- tão cedo não alcançaremos a condição de uma sociedade efetivamente moderna --no sentido correto da palavra-- e menos injusta.

Se a opção for o inconformismo, deve-se distinguir entre a ação política consciente, que define seus objetivos e compreende as dificuldades de alcançá-los, e o vandalismo que, em última instância, termina por impedir a mudança real.


Lembre-se disso, hoje, ao escolher em quem vai votar.