terça-feira, 2 de dezembro de 2014


02 de dezembro de 2014 | N° 18001
LUÍS AUGUSTO FISCHER

A LÍNGUA

Estou vivendo na França por um ano, experiência forte, como dá para imaginar. Ainda mais para quem, como eu, nunca tinha vivido longe do Brasil, apenas passeado. Estar longe da família e dos amigos, assim como longe da paisagem familiar, ser solicitado a conhecer, apreciar, sentir e julgar coisas novas todos os dias, isso tudo vai exigindo energias profundas.

Em parte a distância é bem atenuada pelo Facebook. Nunca tinha vivido tão claramente essa dimensão da globalização internética, e em verdade vos digo – é muito bom ver as curtidas e os comentários, poder intuir o modo como a vida daqui pode ser presenciada, mesmo que vicariamente, por gente querida, de longe.

Entre as tantas coisas relevantes, o tema da língua ressalta, naturalmente. Fico prestando atenção, por exemplo, ao modo como o inglês pressiona a língua local. Tem comissão oficial encarregada de enfrentar a questão, propondo palavras francesas ou neologismos grecolatinos para estrangeirismos indesejados (ainda vou escrever sobre isso alguma coisa). Em princípio acho inútil e mesmo indesejável haver uma comissão assim, ainda mais que, no Brasil, quem a comporia? Melhor nem pensar.

Na prática, o inglês, a língua franca de nosso tempo, deita e rola. Alguns exemplos que andei anotando, de palavras inglesas regularmente empregadas na fala: week-end (não tem equivalente em francês); stop (mãe mandando filho parar, super comum); ok (eles dizem “oquê”, sem fazer ditongo no fim); square (o nome formal da pracinha de bairro); chewing-gum (dito como oxítona, como em tudo); t-shirt; match; sports (é o nome da aula de Educação Física na escola). E por aí vai.


Uma inesperada é “pickpockets”, batedor de carteira. Em muitas das estações de metrô os alto-falantes avisam que é preciso tomar cuidado com eles. De vez em quando aparece escrito o aviso, em mais de uma língua; quando aparece português é o de Portugal, e o “pickpocket” vira “carteirista”. Um brasileiro de nossos dias dirá: “Saudades do tempo em que o batedor de carteira era o problema maior do cotidiano…”.