quinta-feira, 4 de dezembro de 2014


04 de dezembro de 2014 | N° 18003
CARLOS GERBASE

TEMPOS DE CINEMA

Três filmes recentes têm o tempo como elemento principal de suas tramas. Cada um deles utiliza uma estratégia diferente para fazer o espectador refletir sobre essa dimensão misteriosa – mesmo que cotidiana – de nossas vidas. Em X-Men: Dias de um Futuro Esquecido, Bryan Singer tem ao seu dispor um universo cheio de mutantes superpoderosos, o que é bastante conveniente.

Um deles, através de uma poderosa conexão energética, envia alguém para o passado. A partir daí, assistimos às velhas discussões sobre os paradoxos da viagem no tempo. Um evento que já aconteceu pode ser apenas assistido, ou pode ser mudado? Singer se esforça, mas os resultados ficam devendo, e muito, aos autores de ficção científica que já abordaram o tema na literatura e no cinema.

Em Interestelar, Christopher Nolan, em vez de se apoiar nas convenções da ficção científica, faz a história girar em torno das fronteiras da ciência contemporânea. Há montes de diálogos tratando de matemática e física quântica, além de dois espetaculares eventos astrofísicos: o buraco de minhoca e o buraco negro. Até a teoria das cordas, que prevê a existência de outras dimensões espaciais além das três que conhecemos, aparece num enredo que fica no fio da navalha entre a divulgação científica e a absoluta banalização de teorias complexas. É um bom espetáculo, cheio de poderosos efeitos especiais, mas fracassa como Manual de Relatividade para Leigos.

Já Boyhood, de Richard Linklater, não pede que acreditemos num universo paralelo, nem quer ensinar as teorias de Einstein para quem não aprendeu a fórmula de Bhaskara. Boyhood mostra o tempo fluindo. Doze anos na vida de um grupo de pessoas, em especial de um menino que passa da infância para a adolescência. Linklater conseguiu uma façanha: ser original.


Filmes costumam ser feitos em um ou dois anos. Ele filmou durante 12. Essa extraordinária sincronia entre o período de filmagem e o envelhecimento natural dos atores permite que o espectador sinta o fluxo do tempo na tela, numa experiência que nos devolve a esperança de um cinema com mais ideias e menos efeitos. Para mim, Boyhood é uma das grandes obras-primas do cinema neste começo de século. Não perca tempo e vá assistir.