sexta-feira, 2 de janeiro de 2015


02 de janeiro de 2015 | N° 18030
MOISÉS MENDES

Capilé

Estava cruzando por uma esquina da Redação, na semana passada, quando ouvi alguém lançar a pergunta a quem estivesse na volta: por onde anda o Capilé?

Continuei andando, e a pergunta ficou por ali, juntando-se a outras que se dependuram como bicho-preguiça no teto, nas TVs, nas frestas do ar-condicionado, nas testas dos repórteres. Num fim de ano, uma Redação é o lugar das perguntas dependuradas, algumas há décadas.

Por onde anda o moço que surgiu como profeta das mídias sociais? Capilé barbarizou a internet com o Mídia Ninja, na cobertura das manifestações do inverno de 2013. Os ninjas inquietaram o jornalismo. Eram colaborativos e captavam, sem filtros, as imagens e as falas das manifestações.

O guri do Mato Grosso, articulador do Fora do Eixo, cumpriu seu tempo como celebridade midiática e sumiu. O Mídia Ninja continua aí, no site, no Facebook. E bombando.

Depois daquela pergunta sobre o Capilé, fui espiar o Mídia Ninja. Tinha uma longa reportagem do jornal inglês The Guardian sobre a cidade chinesa de Yiwu.

Yiwu produz 60% de todas as bugigangas de Natal para o mundo. Pinheiros de plástico, luzinhas piscantes, Papais Noéis, bonequinhos, bolinhas, renas, trenós.

Yiwu é o lixo do comunismo confuciano a serviço do que existe de pior do capitalismo que obtém vantagens também com as misérias mais distantes. A cidade chinesa do Natal tem 600 fábricas. Os operários trabalham 12 horas por dia em porões.

Li a reportagem e pensei nas coisas que tenho em casa, além das bolinhas de Natal. Que utilidades não vieram da China? É difícil querer discriminar mercadorias chinesas e ficar, como produto genuinamente nacional, apenas com a bomba de chimarrão de mil furos dos Vargas do Alegrete.

Mas agora me incomodam os enfeites piscantes. Como associar Natal, mesmo com todo o consumismo, ao que se passa nas fábricas chinesas?

Falo disso porque me lembrei daquela pergunta sobre o Capilé. Todos os que lidam com informação precisam ser cutucados de vez em quando por um Capilé que nos tire da sesta.


Então, decidi agora que em 2015 quero ter menos produtos chineses e mais Capilés. Tivemos as redes sociais (vivam as redes), com as vozes da diversidade do Facebook, mas faltou um Capilé em 2014. Não dá para ficar sem um Capilé.