12 de janeiro de 2015 |
N° 18040
MOISÉS MENDES
Oportunistas
Você se lembra daquele conhecido
que apareceu de repente ao seu lado nas passeatas do inverno de 2013. O que
aquele cara fazia ali?
Muita gente não sabe o que
determinadas pessoas faziam nas ruas em 2013. Reacionários de naipes variados
tiraram proveito das passeatas. Fascistas desceram a João Pessoa ao seu lado,
nas noites daquele inverno, para afrontar a imprensa e jornalistas considerados
inimigos.
Agora, no fim de semana, as
passeatas em Paris foram pelas liberdades e contra o extremismo que mata. Os
cartunistas da Charlie Hebdo incorporaram a resistência genuína contra terror.
Os franceses morreram pelo humor sem limites.
Todo mundo é Charlie. Sua
namorada é Charlie, seu colega é Charlie, sua tia será Charlie e ai de quem não
queira ser Charlie.
Eu mesmo fui acusado, por causa
de textos que publiquei em ZH, na sexta e no domingo, de não ser Charlie. Ser
Charlie seria o que mesmo?
Seria engajar-se de forma
incondicional a tudo o que os cartunistas faziam? Não há como. Se houvesse, a
Charlie Hebdo não seria uma revista com apenas 50 mil exemplares. E todos
atacariam todos, sem freios. Jesus, Maomé, Nossa Senhora, ateus, prostitutas, ex-comunistas,
africanos, gays seriam apedrejados sem parar.
O mundo seria insuportável se
todos fossem Charlie em casa, na firma, na repartição, na escola ou no
jornalismo.
Assim como seria improvável que,
nos anos 70, todos fossem Pasquim. Seria uma farsa grotesca se, em novembro de
1970, depois da prisão de quase toda a Redação do jornal pela ditadura, os
cariocas tivessem saído às ruas com cartazes: Eu sou Pasquim.
Sei, você pode dizer que a
indignação agora envolve terror e morte. Sei, porque também concordo (mesmo que
não deva ficar dizendo o óbvio) que tudo isso é condenável. Vivo da liberdade
de expressão.
Mas não dá pra aguentar tantos
Charlies. Velhos reacionários brasileiros agora são libertários à francesa.
Como disseram Willem e Luz, dois
cartunistas sobreviventes, os oportunistas deveriam recolher suas pombas da
paz, porque pombas da paz não têm nada a ver com Charlie Hebdo. Mas vá você
dizer a um farsante que ele não é Charlie.