terça-feira, 13 de janeiro de 2015

13 de janeiro de 2015 | N° 18041

ELEIÇÕES 2014 QUEM FICOU COM A CONTA

1% DOS DOADORES PAGARAM 56% DOS GASTOS NO RS

Empresas de alimentação e de construção responderam pela maior fatia do dinheiro arrecadado pelos candidatos

A campanha eleitoral de 2014 contou com 10,8 mil doadores que se dispuseram a financiar algum candidato a deputado estadual ou federal, senador ou governador no Rio Grande do Sul. Mas um seleto grupo de apenas cem contribuintes respondeu por nada menos do que 56% de todo o valor repassado aos concorrentes durante a disputa.

A análise das prestações de contas divulgadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revela a grande concentração do sistema de custeio eleitoral no Estado. A elite dos financiadores – que representa menos de 1% dos mecenas da política regional – desembolsou R$ 80,5 milhões de um total de R$ 144 milhões arrecadados por candidatos, partidos e comitês.

Esse cálculo desconta os valores recebidos por partidos, comitês ou candidatos e repassados para outros partidos, comitês ou candidatos dentro do próprio Estado durante a eleição – o que muitas vezes ocorre –, já que levaria a somar um mesmo recurso mais de uma vez e superestimar a arrecadação eleitoral. A conta inclui, porém, repasses vindos de comitês e candidatos de outros Estados – ou seja, doações que foram feitas em outro local do país, mas acabaram no Rio Grande do Sul. Nesse caso, não há superposição na contabilidade feita com auxílio do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e do advogado, técnico em contabilidade e especialista em contas eleitorais Carlos Souto Júnior.

A lista dos maiores doadores reúne principalmente empresas de grande porte. Quem lidera o ranking dos maiores gastadores é a JBS – gigante do setor de alimentação que alcançou em 2013 a terceira maior receita líquida do país, com R$ 92,9 bilhões, atrás da Petrobras e da Vale. A JBS, que controla a Friboi, repassou pouco mais de R$ 12 milhões (somando R$ 772 mil da JBS Aves) aos candidatos no Estado. A maior parte desse recurso, assim como a de outras grandes companhias, foi doada para diretórios nacionais e transferida pelos partidos para seus correligionários gaúchos.

Em casos como esse, em que a verba muda de mãos, é preciso seguir o caminho do dinheiro até encontrar o doador originário – que deve ser identificado na prestação de contas de todos os candidatos. Porém, a complexidade do sistema de registro e eventuais falhas na identificação dos doadores dificulta esse trabalho.

– Embora os dados sejam públicos, é praticamente inviável para o cidadão saber quanto uma empresa investiu na campanha em um determinado Estado – afirma Souto.

CONCENTRAÇÃO FINANCEIRA OFERECE RISCO, DIZ ANALISTA

O topo da lista é ocupado ainda por Gerdau, com R$ 4 milhões desembolsados, Braskem (R$ 3,9 milhões) e Zaffari (R$ 2,8 milhões). Mas, graças ao montante da JBS, o setor de alimentação é o de maior peso no top 100 das finanças eleitorais no Rio Grande do Sul, com R$ 16,2 milhões investidos. Em seguida, vem a construção, com R$ 9 milhões aplicados, e depois os repasses da indústria em geral, com R$ 7,2 milhões. Chama a atenção, ainda, a presença de empresas ligadas ao fumo e a bebidas alcoólicas no rol de grandes apoiadores, os quais entregaram R$ 4,9 milhões, somados, aos políticos rio-grandenses.

Considerando-se todas as doações feitas, e não apenas a dos cem principais contribuintes, o PT foi o partido com maior arrecadação no Estado – R$ 35,5 milhões. Foi seguido pelo PP, com R$ 33,5 milhões, e pelo PMDB, com R$ 24,2 milhões.

A concentração do financiamento oferece um risco, conforme o cientista político e coordenador do curso de Ciências Sociais da Ulbra, Paulo Moura: que o apoio seja oferecido pelas empresas com a expectativa de receber vantagens depois da eleição.

– Esse fenômeno (da concentração de doações), que se repete em âmbito nacional, certamente exerce influência no processo eleitoral. Empresas que contribuem e têm negócios com o Estado, como as empreiteiras, ou concessão de créditos de bancos públicos acabam criando uma zona cinza em que não fica claro se o sistema político é moralmente correto, ainda que seja legalmene correto – diz Moura.


marcelo.gonzatto@zerohora.com.br