18
de maio de 2014 | N° 17800
L. F. VERISSIMO
A outra vida do sr.
Antônio
Dona
Julinha desconfiou quando entrou na sala a tempo de ouvir seu marido, o sr.
Antônio, dizer “Tchau, amor” e desligar o telefone.
–
Com quem você estava falando, Antônio? – Ninguém. – Como é possível falar no
telefone com ninguém, Antônio?
O
sr. Antônio apenas sorriu. A mesma coisa aconteceu outras vezes depois disso,
até que dona Julinha perdeu a paciência e pediu explicações. Com quem o sr.
Antônio falava ao telefone tão carinhosamente – e se despedia tão rapidamente
quando a mulher aparecia? O sr. Antônio hesitou, depois falou.
–
Está bem, Julinha. Se você quer mesmo saber... Eu tenho outra mulher. Uma
amante. Nos conhecemos há 20 anos.
– O
quê?! E, diante do espanto da mulher, o sr. Antônio completou: – O nome dela é
Sulamita.
Dona
Julinha não sabia o que fazer com aquela informação. De repente, uma Sulamita
na vida deles! O sr. Antônio tinha outra mulher. Outro lar. Talvez outra
família. Outra vida! Logo o sr. Antônio, que um dia declarara “Julinha, eu não
sei se gosto mais de você ou dos meus chinelos de camurça”. Logo o sr. Antônio,
tão caseiro, tão pacato, com uma amante – chamada Sulamita!
Dona
Julinha reuniu os filhos para pedir conselhos. O que deveria fazer? Seu
primeiro impulso fora o de expulsar o marido de casa. Ele que fosse viver com a
outra. Mas os filhos não concordaram. Um divórcio, àquela altura da vida do
casal? Seria complicado. E desnecessário. Dona Julinha que aprendesse a viver
com a nova realidade. Afinal, o sr. Antônio, apesar de ter uma amante durante
20 anos, escolhera ficar com a mulher. De certa maneira, optara pelos chinelos
de camurça.
Durante
semanas, dona Julinha não dirigiu uma palavra ao marido. Comiam em silêncio.
Viam a novela em silêncio. Até que um dia, levada mais pela curiosidade do que
por vontade de brigar, dona Julinha perguntou:
–
Como vocês se conheceram?