02
de junho de 2015 | N° 18181
LUÍS
AUGUSTO FISCHER
CANSAÇO DA CONSCIÊNCIA
Quando
me dei conta já estava pensando: “Estamos precisando de gente que ajude a fazer
convergir”. Sei lá, liderança, algo assim, gente que ajude a convocar de cada
um o que ele tem de melhor, para contribuir para o conjunto. A cidade precisa
de todos, de cada um, da soma das boas vontades.
Era
um sonho, desses que acontecem quando a razão baixa a guarda e o corpo
descansa. Acordei e fiquei com isso na cabeça: fazer convergir, somar,
contribuir para a cidade. Mas como? Mas quem? Mas quando?
Estando
há 10 meses fora de casa, fora do Brasil, numa cidade mundial, acompanho
diariamente o que acontece em Porto Alegre e no país – a internet realmente
mudou o tamanho do mundo, numa proporção semelhante apenas à de outros momentos
de revolução tecnológica, como o fim da Idade Média, quando europeus passaram a
andar pelo mundo espalhando o cristianismo, a gripe e o livro. Ou a meados do
século 19, com o telégrafo. Ou a cem anos atrás, com o rádio. Ou a 50, com a
televisão.
Essa
presença acachapante de tudo o tempo todo, até na mais solitária madrugada, não
é dos menores motivos dessa espécie de cansaço que sinto, que sentimos. Quanto
de nossos atritos no Facebook se deverá a isso?
Nelson
Rodrigues, numa piada conservadora e regressiva, atribuiu a Marx a invenção do
idiota como protagonista. Antigamente, observava ele, o imbecil passava rente
às paredes, ciente de sua insignificância, da qual só saía para ter filhos. Até
que Marx deu a ele a notícia de sua superioridade numérica.
Nelson
estava errado. Não foi Marx, mas a burguesia que transformou cada um em cidadão
(para a República) e consumidor (para o mercado). De lá para cá, o processo se
acelerou, e agora cada um é uma fonte de notícias (sobre si mesmo) e de
opiniões (sobre qualquer coisa).
Lembrei
de outra piada, ou causo: contaram a um velho gaúcho, que vivia num fundo de
campo, sem luz elétrica ou rádio, que um foguete tinha chegado à Lua, descido e
tal. Que lhe parecia? Pausa e diz ele: “Olha, tchê, depois que inventaram o
debulhador de milho eu não duvido de mais nada”.