05
de junho de 2015 | N° 18184
MARCOS PIANGERS
O pai
da Gabriela
Sempre
que ia deixar minha filha na escolinha, vinha aquela menina de cabelo crespo. O
nome dela era Gabriela. Enquanto dava tchau pra minha filha, a Gabriela sempre
puxava papo, sobre os mais diversos assuntos. “Aquele é o seu carro?”, ela
perguntava. “Sim”, eu respondia. “O do meu pai é melhor.” Aquilo me deixou meio
constrangido. “O carro do meu pai é bem grandão. E superbonito”, disse a
Gabriela.
Com
o tempo percebi que o objetivo da Gabriela era me desmoralizar. Só pode. Eu
dando beijos de despedida na minha pequena e lá vinha ela. “Você é magro”, me
disse uma vez. “Você acha? Até que estou me achando barrigudo”, eu disse. “Meu
pai é forte. Ele consegue me levantar com um braço só”, ela falou. E assim era
quase todo dia. “Meu pai tem um trabalho superbom.” “Meu pai comprou uma casa
enorme.” “Meu pai se veste melhor que você.”
Era
como se a Gabriela fizesse bullying comigo. Comecei a evitar despedidas longas
na frente do portão da escola, só pra não ser agredido pela Gabriela. Eu estava
cansado de ser comparado com o pai da menina. Comecei a imaginar aquele cara,
mais forte do que eu, mais bem-sucedido. Carro melhor, cabelo melhor, sorriso
mais bonito. “Meu pai não tem essa barba feia”, ela disse pra mim uma vez,
olhando meu cavanhaque. O pai da Gabriela era uma mistura de Rodrigo Hilbert
com George Clooney.
Passei
a evitar a saída da escola. Me incomodava a possibilidade de encontrar o pai da
Gabriela. Será que ele também iria me humilhar, como a filha tinha feito
durante quase um semestre? Aquele homem carismático e charmoso iria apertar
minha mão e dizer: “Você deve ser o barbudo raquítico de quem minha filha tanto
fala!”. Até que um dia vi a Gabriela no colo de um homem. Os dois se abraçando,
o olho da Gabriela brilhando enquanto olhava pra ele.
Era
um sujeito baixinho. Usava um terno maior do que devia, a bainha estava mal
cortada. Era meio careca na região da testa, o nariz certamente não poderia ser
chamado de pequeno. Estava feliz com a Gabriela no colo. Me cumprimentou
rapidamente. Carregando mochila e brinquedos, dava beijos na barriga da filha,
que gargalhava. Entraram os dois num Corsa sedan. E foram embora, sorrindo os
dois. Gabriela e seu herói.