06
de agosto de 2013 | N° 17514
LUIZ
PAULO VASCONCELLOS
Esperando Godot
Em
1953, há 60 anos, portanto, estreava em Paris Esperando Godot, de Samuel
Beckett, a peça que melhor simboliza a vertente da angústia metafísica no
teatro do século 20. Antes de Godot, tivemos excelentes artistas e movimentos
revolucionários – surrealismo, dadaísmo, Artaud, Craig, Jarry –, mas nada
representou com tanta certeza a falta de sentido que tomou conta do mundo
depois das duas guerras, sob o impacto do nazismo e com a ascensão hegemônica
do capitalismo americano e do comunismo. E até hoje – ouso dizer – Esperando
Godot é a síntese da derrocada do homem-social preconizado por Darwin, Zola,
Ibsen e tantos outros.
Na
peça, dois vagabundos diante de uma árvore esperam por... Godot. Quem é Godot?
Ninguém sabe. Nem o próprio Beckett, pois, quando lhe fizeram a pergunta, com
muito bom humor respondeu: “Se eu soubesse, teria dito”. Mas Godot não vem.
Mesmo assim, Vladimir e Estragon, os dois vagabundos, continuam a esperar.
Afinal, ele prometeu que viria. Mas, ao final de cada dia, sempre aparece um
menino com um recado: ele virá amanhã, sem falta. Mas nunca vem.
As
condições em que os personagens vivem são as mais rudimentares. Cobertos de
trapos e se alimentando apenas com um nabo e uma cenoura, eles permanecem fiéis
à missão de encontrar alguma certeza que dê sentido às suas vidas. Porque, no
universo em que vivem, nem tempo nem espaço são reais, e a memória é tão frágil
que não reproduz qualquer vestígio de uma realidade vivida ontem. É por isso
que Estragon sonha em enforcar-se na esperança de ter ainda uma ereção.
Os
outros personagens – Pozzo e Lucky – representam a ordem determinada pelo
poder: Pozzo é um latifundiário escravagista, e Lucky, o escravo. Como Lucky
chora ao ouvir que Pozzo pretende livrar-se dele, concluímos que a condição de
explorado talvez seja mais cômoda que a de explorador. A comprovação de tudo
isso se deu numa apresentação para uma plateia de detentos da Penitenciária de
San Quentin, em 1957.
A
escolha do espetáculo foi pelo fato de não haver mulheres no elenco. Mas o
grupo estava muito nervoso por apresentar um texto tão intelectual para uma
plateia tão primária.
Quando
as cortinas se abriram, o que prevaleceu foi o silêncio emocionado do público.
Nos dias seguintes, os jornais do presídio publicaram comentários que
comprovavam a total identificação entre público e personagens: “Godot é a
sociedade”, “Ele representa a liberdade”, “Nós sabemos o que significa
esperar”, foi o que disseram.
Nós
também...