É necessário αbrir os olhos e perceber que αs coisαs boαs estão dentro de nós, onde os sentimentos não precisαm de motivos nem os desejos de rαzão. O importαnte é αproveitαr o momento, pois α vidα estα nos olhos de quem sαbe ver. Tento me lembrαr, de tudo que vivi, o que tem por dentro, ninguém pode roubαr. Pois os diαs ruins, todo mundo tem já jurei prα mim, não desαnimαr, não ter mαis pressα , eu sei que o mundo vαi girar . . .Eu espero α minhα vez.
quinta-feira, 31 de janeiro de 2013
Eu gostaria que na correria da época atual a gente
pudesse se permitir, criar, uma pequena ilha de contemplação,
de autocontemplação, de onde se pudesse ver melhor todas
as coisas: com mais generosidade, mais otimismo, mais respeito,
mais silêncio, mais prazer. Mais senso da própria dignidade,
não importando idade, dinheiro, cor, posição, crença.
Não importando nada.[D.A]
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de janeiro de 2013 | N° 17329
EDITORIAIS
ZH
CONJUNTO DE
OMISSÕES
Estão
reunidas as principais evidências de que a tragédia de Santa Maria resultou de
um conjunto de negligências. Também é inquestionável que as omissões e
transgressões constatadas até aqui caracterizam crimes graves. Resta apenas, a
partir das investigações, tipificar os delitos cometidos e apontar seus
responsáveis, para que o inquérito seja encaminhado à Justiça e se faça a
reparação possível. Até lá, tudo o que não deveria ocorrer já está acontecendo,
que é o jogo de empurra entre autoridades municipais e estaduais e a tentativa
de politização do caso.
É
evidente que os proprietários da boate, os artistas, a prefeitura e os
bombeiros terão de se submeter a avaliações da polícia e do Ministério Público,
com a decisiva colaboração da imprensa. Negar-se a admitir falhas, tentar
transferi-las a outras instituições ou adotar atitudes diversionistas, como vem
ocorrendo desde o início das investigações, são posturas que apenas tumultuam as
sindicâncias.
É
óbvio que os proprietários da boate devem ser os primeiros a responder por seus
atos. A responsabilidade empresarial, por princípio, independe de ações
fiscalizadoras. Qualquer atividade deve se submeter às leis e normas
civilizatórias que regulam negócios, relações humanas e todas as formas de
convivência coletiva.
A
origem da tragédia está, portanto, na conduta inescrupulosa dos que pensaram em
obter lucros a qualquer custo. Já está provado que a boate tinha um teto com
revestimento de espuma instalado à revelia das normas de segurança e depois da
última vistoria pelos bombeiros e que nem mesmo os extintores funcionavam –
fora outras sérias deficiências de segurança.
Se
essas falhas combinadas criaram o ambiente que provocou a tragédia, os órgãos
responsáveis pela fiscalização falharam em suas atribuições. É aqui que o setor
público aparece, não como investigador, mas agora como investigado. A
prefeitura de Santa Maria e os bombeiros, os principais envolvidos nas
suspeitas de omissão, não podem, sob o argumento de que defendem os pontos de
vista corretos, retardar ou fornecer informações pela metade e tentar ocultar
documentos.
Nesse
contexto, Ministério Público, imprensa e cidadãos têm que continuar
pressionando para que os relapsos e gananciosos sejam responsabilizados e
também para que o natural sentimento de revolta da população não derive para
linchamentos e injustiças.
Uma
investigação rigorosa e transparente é o único caminho para evitar
mal-entendidos e, na sequência dos desdobramentos da tragédia, contribuir para
que se esclareçam outros casos. É no mínimo inusitada, por exemplo, a situação
de seis casas noturnas de Porto Alegre que, segundo a prefeitura, funcionam com
liminar da Justiça, depois de terem sido interditadas pela fiscalização. A
situação das boates deve ser reavaliada, e com urgência, para que nenhuma
instituição corra o risco de ser avalista de imprudências como as que levaram à
tragédia de domingo.
31
de janeiro de 2013 | N° 17329
ARTIGOS
- Pedro Westphalen*
Compromisso com o
futuro
Dentre
as convicções que formei na vida pública, a maior e a mais profunda é a de que
o parlamento expressa a diversidade de uma sociedade e a maturidade política de
um povo.
É no
Legislativo, dos debates nas comissões; do exercício do diálogo nos gabinetes e
em plenário; das vozes alçadas da tribuna, que se manifestam, permanentemente,
os anseios de uma sociedade. O Poder Legislativo é, em essência, a dinâmica do
diverso. Um mosaico de ideias que cumpre seu destino ao rechaçar rupturas
insuperáveis, resultando na garantia aos diretos individuais e coletivos. Assim
é que tal poder deve ser preservado.
Penso
que o parlamento gaúcho tem avançado neste sentido. Nele temos aprofundado as
relações democráticas, sem calar diversidades. E isso se demonstra no
simbolismo de minha posse, quando assume uma Mesa que contempla todas as
correntes políticas, fato que vem se repetindo nas últimas legislaturas.
Sem
descuidarmos da independência dos três poderes – porque acreditamos na harmonia
da representação e da participação democráticas – queremos contribuir para que
o nosso Estado encontre o seu verdadeiro tamanho. Nem um Estado máximo,
centralizador de iniciativas; nem um Estado mínimo, omisso em suas
responsabilidades constitucionais.
Sei
que esta missão exigirá de mim novas e redobradas responsabilidades. Pretendo
desempenhá-las, todas, sem, entretanto, esquecer os compromissos assumidos como
deputado. Notadamente a bandeira da saúde.
Por
saber que o tema da saúde não se encerra na necessidade da reformulação na
dinâmica do SUS, é que iremos contribuir para o resgate do passivo da
desassistência. Que vai desde uma simples consulta, passando por internações,
cirurgias eletivas, e até mesmo as de urgência, às quais o povo tem direito,
mas não está tendo acesso.
Outra
área que terá atenção especial será a educação. Por ser, cada vez mais, a
maior, a mais moderna e a mais poderosa arma na defesa de um povo. Que nossos
corações e mentes estejam abertos para resgatar o papel honorável dos nossos
educadores e a excelência dos espaços de saber.
Queremos
a modernidade da técnica aliada a profissionais bem remunerados, perseguindo a
qualidade do ensino. Por isso, assumimos o compromisso de trabalhar
incansavelmente para que iniciativas e projetos na área da educação recebam a
atenção que lhes é devida.
No
âmbito da parceria que desejamos entre poder público e sociedade civil, iremos
considerar os debates e os diagnósticos relativos aos desafios do nosso Estado,
tais como a Agenda 2020, o Pacto pelo Rio Grande, a Convergência e o Pacto pela
Saúde. Destas iniciativas resultaram documentos coletivos que, com exatidão
matemática, apontaram desafios e alternativas para o nosso desenvolvimento.
Não
são documentos de governo. Constituem-se, sim, em documentos de Estado, cujo
objetivo maior é garantir um crescimento continuado para o Rio Grande.
Por
isto, e por sermos líderes políticos transitórios no exercício do poder,
precisamos dar continuidade a um plano de futuro. Precisamos criar a cultura do
futuro, pois ele já bate à porta. Um futuro do qual nossos filhos, e os filhos
dos nossos filhos, são os legítimos credores.
Essa
é a nossa maior e mais importante missão.
*PRESIDENTE
DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RS
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de janeiro de 2013 | N° 17329
CINEMA
NA TV POR ASSINATURA | por Daniel Feix
Filmes em destaque na programação
de hoje dos canais pagos:
VIAJO
PORQUE PRECISO, VOLTO PORQUE TE AMO De Karim Aïnouz e Marcelo Gomes. Com
Irandhir Santos. Filme rápido, curto, mas absolutamente certeiro. As imagens
foram captadas como se fosse um documentário, explorando texturas típicas do
Super-8 e do 16mm, entre outras. Só depois foram encaixadas na narrativa sobre
um geólogo que aparece apenas narrando suas desventuras pelo sertão nordestino
durante o mapeamento de uma área que será inundada devido à criação de uma
represa. As imagens são emocionantes, e os personagens, inesquecíveis. Drama,
Brasil, 2009, 72min. Canal Brasil, 9h40min.
ATRAÇÃO
PERIGOSA (The Town) De e com Ben Affleck. Com Rebecca Hall e Jon Hamm. Antes de
se tornar favorito ao Oscar com Argo, Affleck dirigiu este bom thriller sobre
um bando de assaltantes que acaba se envolvendo demais com uma ex-refém.
Confira: o ator tem talento também na realização. Suspense, EUA, 2010, 125min.
HBO HD, 12h35min.
UM
DOMINGO QUALQUER (Any Givern Sunday) De Oliver Stone. Com Al Pacino, Dennis
Quaid e Cameron Diaz. Falta foco a Stone neste grande apanhado dos bastidores
do futebol americano, mas ele mostra o jogo de dentro como raras vezes o cinema
conseguiu mostrar. Drama, EUA, 1999, 150min. Max Prime, 17h15min.
SEVEN
OS SETE CRIMES CAPITAIS (Se7en) De David Fincher. Com Morgan Freeman, Brad Pitt e Kevin Spacey. Dois
policiais, um novato e um veterano, são designados a capturar um serial killer
que baseia seus crimes nos sete pecados capitais. Envolvente e assustador, este
ótimo exercício de gênero impulsionou a carreira do hoje consagrado David
Fincher. Suspense, EUA, 1995, 127min. HBO 2, 18h45min.
RITA
CADILLAC, A LADY DO POVO De Toni Venturi. É impressionante a maneira como a
ex-chacrete abre o coração diante das câmeras do diretor Toni Venturi (de Cabra
Cega e do mais recente Estamos Juntos). O mergulho na intimidade de Rita
Cadillac revela uma sex-symbol já nem tão segura de si e, por isso mesmo, mais
atraente em sua condição de personagem da cultura popular. Documentário,
Brasil, 2010, 75min. Canal Brasil, 22h.
ZAZIE
NO METRÔ (Zazie dans le Métro) De Louis Malle. Com Catherine Demongeot e
Philippe Noiret. Um raro Malle não polêmico, este filme datado do início de sua
carreira sucedeu a Amantes (1958), um de seus títulos mais provocativos.
Trata-se de uma espécie de fábula sobre uma garota do interior que descobre
Paris e os parisienses, em suas nem sempre estimulantes idiossincrasias.
Comédia, França/Itália, 1960, 89min. Telecine Cult, 22h.
PSICOSE
(Psycho) De Alfred Hitchcock. Com Anthony Perkins e Janet Leigh. O que ainda
não foi dito sobre este que é um dos melhores suspenses de terror já feitos? Há
muitos causos sobre a produção, entre eles aquele que aponta que Hitchcock
teria imaginado a clássica sequência do chuveiro antes do próprio filme e o que
indica que o cineasta teria comprado anonimamente os direitos do livro de
Robert Bloch e em seguida trabalhado para tirar de circulação todos os seus
exemplares, de modo que o final da história não fosse conhecido do público
antes de seu lançamento.
Como
uma lenda só se constrói a partir de uma verdade, mesmo que remota, pode-se
dizer que esta historieta dos direitos autorais, falsa ou verdadeira, existe
porque o desfecho, de fato, deixa os espectadores de primeira viagem com seus
respectivos queixos no chão. Um dos grandes lances de Hitchcock, aqui, é
exatamente a forma de trabalhar as viradas da trama, surpreendendo a plateia.
No início, por exemplo, parece que Psicose vai
narrar a fuga de Marion (Janet Leigh). Quando ela se hospeda no Bates Motel e o
foco se volta para seu perturbado atendente Norman Bates (Anthony Perkins), o
público já está totalmente fisgado. Suspense, EUA, 1960, 108min. Telecine Cult,
15h10min.
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de janeiro de 2013 | N° 17329
PAULO
SANT’ANA
O perigo de
viver
Escrevi
inúmeras vezes neste espaço que era perigosíssimo ser jornalista e que quem
exercia esta profissão corria todos os dias grandes riscos.
Vejo
só agora que foi uma bobagem o que escrevi: não é perigoso ser jornalista,
perigoso é viver.
Vou
dar um exemplo: quem calcularia que os mais de 230 jovens que morreram na boate
em Santa Maria, quando se dirigiram para a festa, estavam correndo risco?
Rigorosamente, ninguém imaginava que era perigoso ir a uma festa.
E,
no entanto, como os fatos provaram, foi terrivelmente perigoso.
É
perigoso casar-se e ainda perigoso ficar solteiro. É perigoso, portanto, viver.
Não
há nada mais perigoso do que entrar no trânsito dirigindo. Mas ficar em casa
sem dirigir é perigoso também, pode a casa ser tragada pela terra, como tantas
vezes aconteceu, como anteontem aconteceu na China.
É
perigoso ser autoridade e mais ainda que perigoso é não ser autoridade e ser
governado como súdito.
É
perigoso acordar com a notícia de que os combustíveis tiveram seus preços
aumentados. E já pensaram no perigo que encerrava para o Grêmio o jogo que ele
teria à noite contra a LDU?
É
perigosíssimo ser velho, mas a juventude encerra mil perigos ao seu redor.
É
perigoso apaixonar-se, mas às vezes é ainda mais perigoso não amar ninguém,
pode-se morrer de tédio.
É
perigoso fazer a assinatura de um jornal, tomando conhecimento de tragédias
terríveis, mas não assinar o jornal encerra perigos ainda maiores, entre os
quais o de alienar-se do mundo, o que é fatal.
Já
fiz muitas ressonâncias magnéticas com contraste na veia para cuidar da minha
saúde. Sempre entreguei minhas veias para o contraste com desconfiança.
Pois
não é que anteontem morreram três pessoas em Campinas pelo motivo direto de que
foram submetidas a contrastes em ressonâncias magnéticas?
Ou
seja, perigoso é viver. Vou mais longe, viver é mais perigoso que morrer.
O
único perigo que a morte encerra é de morrermos amanhã e sermos esquecidos para
sempre.
Eu
me tracei o dever de nunca esquecer, jamais, os mortos, como os de Santa Maria.
31
de janeiro de 2013 | N° 17329
L.
F. VERISSIMO
Muito Tony
Kushner
Lincoln
é a segunda colaboração do Steven Spielberg com o dramaturgo Tony Kushner. A
primeira foi Munich, em que o roteiro de Kushner e de um coautor incluía crises
de consciência dos agentes de Israel encarregados de vingar o massacre de
atletas judeus por palestinos na Olimpíada de Munique de 1972 e impediu que o
filme fosse apenas uma glorificação da vingança.
Kushner
é judeu, como Spielberg, mas é um conhecido crítico do sionismo e da política
de Israel em relação aos palestinos e um esquerdista ativo e combativo.
Spielberg é um dos “liberais”, no sentido anglo-saxão da palavra, de Hollywood,
que votam nos democratas, fazem filmes sobre causas nobres como a dos direitos
civis de minorias e podem ser definidos como da esquerda confortável.
A
parceria Spielberg/Kushner é insólita em outro sentido. Spielberg faz cinemão –
bom cinemão, mas cinemão – e Kushner é o mais notório autor de vanguarda do
teatro americano, com previsível desdém pelo teatro convencional e pelas
grandes produções do cinema comercial.
Uma
curiosidade: no final da primeira parte da sua peça Anjos na América (as duas
partes encenadas juntas tem mais de sete horas de duração), desce no palco um
anjo mensageiro para anunciar a vinda do novo milênio e, supõe-se, a purgação
dos pecados da América. Sua chegada, numa nuvem colorida, derrubando cenários e
acompanhado de raios e música bombástica, é espetacular. Tanto que um dos
personagens comenta:
–
Muito Steven Spielberg.
Do
filme Lincoln, pode-se dizer que é muito Tony Kushner. São espetaculares as
atuações de Daniel Day-Lewis, Tommy Lee Jones e Sally Fields, mas há pouco
espetáculo do Spielberg. Kushner concentrou-se na capacidade política de
Lincoln e no fim a abolição da escravatura é apresentada como um triunfo das
suas palavras e da sua personalidade – com um pouco de ajuda de propinas a congressistas.
Há
só uma cena, curta, de guerra, no começo do filme. E é tão reticente a direção
de Spielberg, que não se vê nem o assassinato de Lincoln, uma cena que
presumivelmente permitiria ao diretor dar o seu show. Mas Kushner não deixou.
Ficamos sabendo da morte do presidente de ouvir dizer.
Nos
Estados Unidos discute-se se Lincoln é de esquerda ou de direita. A esquerda
reclama que o filme reforça a ideia de que a História é feita por líderes e
heróis excepcionais, a direita reclama que outras causas da Guerra Civil, como
a dos direitos estaduais diante da prepotência da União, foram mais importantes
do que a escravatura e nem são citadas. Eu acho que o filme seria melhor se o
Spielberg tivesse mais solto. Ou então se o Kushner enlouquecesse. Um anjo
mensageiro descendo no meio da bancada antiabolicionista do Congresso e
anunciando a vinda do Obama, por que não?
quarta-feira, 30 de janeiro de 2013
30/01/2013 - 03h00
Antonio Prata
Todos juntos
Acho
que já contei aqui a história, mas a ocasião me permite repeti-la. Eu tinha 18
anos e estava em minha primeira aula de filosofia, na USP. O professor, Renato
Janine Ribeiro, nos explicava que no fim do semestre seríamos avaliados por um
trabalho individual, cujo limite deveria ser de 8.000 caracteres.
Levantei
a mão: "Se estourar um pouquinho esse limite, tudo bem, né?". Janine
sorriu e disse algo mais ou menos assim: "O que é 'limite'? É aquilo que não
se pode transpor. Mas vejam como são as coisas no Brasil: entre nós, o limite não
limita! Repito: o limite é de 8.000 caracteres".
Peço
perdão ao filósofo se as palavras não foram exatamente essas. Assim, porém, é que
ficaram gravadas na minha memória e é assim que me voltam, quase todo dia,
quando me deparo com a nossa ilimitada necessidade de burlar a lei.
Há uma
altura máxima para prédios na rota do aeroporto, mas o empreiteiro constrói um "puxadinho",
alguns metros acima. A construtora precisa botar de tantos em tantos metros,
sob o concreto da rodovia, umas ripas de metal, mas economiza dinheiro
aumentando a distância entre elas. Quantas pessoas que compraram a carta de
motorista você conhece?
Que
têm gato de TV a cabo? Que já subornaram um guarda de trânsito para não ser
multado? O avião vai decolar, o comissário de bordo pede para desligarem os
celulares, mas o sujeito o ignora solenemente. O avião pousa, o comissário pede
aos passageiros para que aguardem sentados até o "apagar do aviso luminoso
de atar cintos", mas todo mundo levanta. Não um, não dois: todo mundo --como
se respeitar aquele simples sinal luminoso equivalesse a ter a palavra otário
escrita na testa.
Um
sinal luminoso também piscou na cabine do Fokker 100 da TAM, que taxiava na
pista de Congonhas na manhã de 31 de outubro de 1996, alertando sobre um
problema no reverso da turbina. O piloto o desligou. O luminoso piscou
novamente, novamente foi desligado. Segundo o depoimento de outro piloto, dias
mais tarde, esse era o costume: se fossem dar atenção a todo alarme que soava
na cabine, nenhuma aeronave saía do chão. Às vezes, ao que parece, alarmes soam
à toa. Às vezes, não: 24 segundos depois de decolar, o avião caiu, matando 99
pessoas.
Eu
estava saindo para a USP, naquela manhã, quando o telefone tocou. Uma amiga do
meu pai queria saber se era verdade que meu tio Duda, irmão da minha mãe e meu
padrinho, estava entre os passageiros. Liguei a televisão. Vi a lista. Era
verdade.
Nas
próximas semanas, o Brasil concentrará suas energias em encontrar os culpados
pela tragédia de Santa Maria. É fundamental, se houver culpados (como parece
ser o caso), que eles sejam punidos.
É fundamental
que as casas de show passem por reavaliações, como já estão passando. Mas se não
mudarmos a nossa mentalidade, se não entendermos que as leis são universais,
que há procedimentos que precisam ser executados conforme as regras, sem
jeitinho, sem gambiarra, em TODAS as esferas, por TODAS as pessoas, as tragédias
continuarão acontecendo --e a morte é um limite que nós, brasileiros, por mais
espertos que nos julguemos, não somos capazes de transgredir.
antonioprata.folha@uol.com.br
MARCELO
COELHO
Pureza armada
Qualquer
transgressão é apresentada como direito; se roubaram você, responda roubando
também
A
notícia, que saiu no UOL há algum tempo, tinha me deixado curioso. Alguém em
Brasília encaminhou pedido ao Ministério Público para que "O Livro Maldito"
(editora BestSeller) tivesse sua venda proibida no país.
Os
motivos para essa interdição estariam até mesmo na contracapa do volume. O
autor, Christopher Lee Barish, promete ensinar uma série de coisas proibidas.
"Assalte
um banco." "Arrombe fechaduras." "Forje a própria morte."
"Minta para um polígrafo."
E
outras coisas, "muito, mas muito piores", promete a contracapa. Fui
ver.
A
maior parte das transgressões de "O Livro Maldito" tende para o café pequeno.
"Como não limpar o cocô de seu cachorro", "como burlar máquinas
de refrigerante" ou "como escapar de ser jurado num tribunal" não
constituem objetivos tão diabólicos assim.
Uma
seção especial, destinada "a criminosos", promete ensinar os incautos
a falsificar dinheiro, a entrar para a máfia e a contrabandear drogas.
Mas
basta ler um pouquinho para perceber que o propósito de "O Livro Maldito"
é humorístico e que nenhuma das suas informações seria capaz de garantir por
mais de meia hora a sobrevivência do leitor no mundo do crime.
O
interessante, na verdade, está em ver que tipo de humorismo é esse.
Veja-se
como começa o capítulo sobre como enganar uma máquina de refrigerantes.
"Quantas
vezes, ao longo da vida, você já foi roubado por uma dessas máquinas?" Elas
"passaram a perna em você -e agora está na hora de dar o troco", diz
o autor.
Segue-se
uma impraticável explicação de como colar uma fita adesiva dos dois lados de
uma cédula de dinheiro, deixando um rabicho para puxá-la de volta.
O
essencial -e tão tipicamente americano, aliás, quanto o uso cotidiano dessas máquinas-
está no gênero de argumentos utilizado pelo autor.
Em
resumo, qualquer transgressão é apresentada como um direito legítimo. Se
roubaram você, responda roubando também.
Outro
exemplo. Se um guarda de trânsito pretende multá-lo por excesso de velocidade, "pergunte
sobre o radar dele", recomenda o livro. Isso porque em muitos lugares dos
Estados Unidos é lícito exigir do guarda o certificado de aferição do aparelho.
O
autor também oferece muitas razões "legítimas" para nos instruir a
roubar no jogo de dados. O cassino vive de arrancar nosso dinheiro; "a única
maneira boa de se vingar é tomando o dinheiro dele".
As
dicas do livro a esse respeito são obviamente delirantes: "pratique jogar
dados colocando para cima os números que você quer", e "lance-os de
tal maneira que não haja muita rotação".
Ah,
bom. Muito obrigado. Agora estou pronto para a desforra.
Tantas
reparações imaginárias contra "os verdadeiros ladrões" têm, na
verdade, um pressuposto até ingênuo.
A
ideia, especialmente estranha para nós brasileiros, é a de que o cidadão é em
sua essência honesto e, sobretudo, detentor de direitos. É em defesa desses
direitos que ele encontra justificativa para quebrar a lei; a boa notícia está no
fato de que, em última análise -como no caso das multas de trânsito-, o próprio
sistema judiciário facilita esse tipo de comportamento.
No
Brasil, tudo teria de ser escrito ao inverso. Estamos culturalmente preparados
para um estado de culpa, e não de inocência. Se apanhados em alguma transgressão,
nossa tendência será dizer que todo mundo faz o mesmo.
Nos
Estados Unidos, pelo menos através das lentes satíricas de "O Livro
Maldito", a atitude é outra: que autoridade tem o guarda para me acusar de
alguma coisa?
Sem
ser especialmente engraçado, muito menos útil, e menos ainda pernicioso, o
livro de Christopher Barish ajuda a entender um pouco dos aspectos mais
misteriosos da psique americana.
A
partir desse pressuposto da inocência e do recurso à ilegalidade como um
direito dos cidadãos, fica mais clara, por exemplo, a estranha atitude de
tantos americanos com relação à posse de armas de fogo.
Eles
se batem por um direito que, em qualquer outro país, passa por um evidente e
patológico desejo homicida. Liberar a compra de metralhadoras? No Brasil ou no
Canadá, um "princípio" desses constitui o mais rematado absurdo.
É preciso
acreditar muito na própria inocência, sem dúvida, para fazer tanta questão de
possuir um arsenal dentro de casa. Dizer-se roubado, fazer-se de vítima, ver o
crime nas intenções dos outros -eis, na verdade, um bom caminho para se tornar
criminoso também.
coelhofsp@uol.com.br
ESSE JEITO
BREJEIRO DE CAMPONESA ENTRE VERDES
E FLORES AR
FRESCO DE TERRA MOLHADA É TUDO QUE
UMA ALMA FICA
FELIZ E LEVE PARA ONDE OLHA ENXERGA
BELEZAS DA
NATUREZA EM SINTONIA COM A MANEIRA DE
RECEBER
USUFRUIR E ESPALHAR. . .
É UMA ATITUDE
MERECEDORA DE
APLAUSOS UMA VEZ RECEBIDA O PRÓXIMO
PASSO É DOAR
COM A MESMA INTENSIDADE DA PRIMEIRA HORA.
BELEZAS
NOSSAS COM CARINHO VAMOS AO ENCONTRO.
DE VIVER NA
PLENITUDE TODOS OS SONHOS QUE UM DIA
BROTARAM NO
CORAÇÃO E ACOLHEMOS NAS MÃOS.
NOSSAS
ESCOLHAS COM MUITAS CORES QUE ILUMINAM
E VALORIZA A
VIDA!
SOL
HOLME
30
de janeiro de 2013 | N° 17328
MARTHA
MEDEIROS
Empatia
As
pessoas se preocupam em ser simpáticas, mas pouco se esforçam para ser
empáticas, e algumas talvez nem saibam direito o que o termo significa. Empatia
é a capacidade de se colocar no lugar do outro, de compreendê-lo
emocionalmente. Vai muito além da identificação. Podemos até não sintonizar com
alguém, mas nada impede que entendamos as razões pelas quais ele se comporta de
determinado jeito, o que o faz sofrer, os direitos que ele tem.
Nada
impede?
Foi
força de expressão. O narcisismo, por exemplo, impede a empatia. A pessoa é tão
autofocada, que para ela só existem dois tipos de gente: os seus iguais e o
resto, sendo que o resto não merece um segundo olhar. Narciso acha feio o que
não é espelho.
Ele
se retroalimenta de aplausos, elogios e concordâncias, e assim vai erguendo uma
parede que o blinda contra qualquer sentimento que não lhe diga respeito. Se
pisam no seu pé, reclama e exige que os holofotes se voltem para essa agressão
gravíssima. Se pisarem no pé do outro, é porque o outro fez por merecer.
Afora
o narcisismo, existe outro impedimento para a empatia: a ignorância. Pessoas
que não circulam, não possuem amigos, não se informam, não leem, enfim, pessoas
que não abrem seus horizontes tornam-se preconceituosas e mantêm-se na
estreiteza da sua existência. Qualquer estranho que possua hábitos diferentes
será criticado em vez de respeitado. Os ignorantes têm medo do desconhecido.
E
afora o narcisismo e a ignorância, há o mau-caratismo daqueles que, mesmo tendo
o dever de pensar no bem público, colocam seus próprios interesses acima do de
todos, e aí os exemplos se empilham: políticos corruptos, empresários que só
visam ao lucro sem respeitar a legislação, pessoas que “compram” vagas de
emprego e de estudo que deveriam ser conquistadas através dos trâmites usuais,
sem falar em atitudes prosaicas como furar fila, estacionar em vaga para
deficientes, terminar namoros pelo Facebook, faltar compromissos sem avisar
antes, enfim, aquelas “coisinhas” que se faz no automático sem pensar que há
alguém do outro lado do balcão que irá se sentir prejudicado ou magoado.
É um
assunto recorrente: precisamos de mais gentileza etc. e tal. Para muitos, puxar
uma cadeira para a moça sentar ou juntar um pacote que alguém deixou cair,
basta. Sim, somos todos gentis, mas colocar-se no lugar do outro vai muito além
da polidez e é o que realmente pode melhorar o mundo em que vivemos. A cada
pequeno gesto diário, a cada decisão que tomamos, estamos interferindo na vida
alheia. Logo, sejamos mais empáticos do que simpáticos.
Ninguém
espera que você e eu passemos a agir como heróis ou santos, apenas que tenhamos
consciência de que só desenvolvendo a empatia é que se cria uma corrente de
acertos e de responsabilidade – colocar-se no lugar do outro não é uma simples
gentileza que se faz, é a solução para sairmos dessa barbárie disfarçada e
sermos uma sociedade civilizada de fato.
30
de janeiro de 2013 | N° 17328
ARTIGOS
- Percival Puggina*
Cruel
pedagogia
Do
alto de seus 20 anos, os jovens contemplam a vida como quem, do alto de uma
montanha, observa, extasiado, o mundo ao seu redor. Horizontes amplos,
infinitas trilhas e 360 graus de possibilidades. Nessa idade, eu me lembro
muito bem, a vida é eterna e a esperança infinita.
Só
os avós morrem quando se tem 20 anos. O velório de um jovem é inconcebível
ruptura com a ordem natural. Contudo, a morte espreita a juventude com olhos
cobiçosos. Enquanto os idosos morrem porque chegou a hora, porque dar adeus à
vida terrena é próprio da velhice, os jovens morrem de infinitas maneiras,
revelando inesperada vulnerabilidade.
Idosos
morrem porque não podem alterar o curso da vitalidade que se extingue. Jovens,
porém, morrem desnecessária e superfluamente, por motivos que poderiam ser
evitados. Essa é a tragédia das tragédias cotidianas. Ir-se assim, sem que nem
por quê? Jovens morrem nas ruas, nas estradas, nas brigas entre gangues, na
lenta e dolorosa morte das drogas, nas madrugadas em que a violência espreita,
nas infames brigas por motivos fúteis.
Morrem
nas aventuras e travessuras, na terra, na água e no ar. Por isso, pais e mães
carregam no peito uma incompreendida e permanente aflição. A respiração para
quando o telefone toca e para quando o telefone não toca. Paranoicos, nós? Não,
não. Simplesmente pais cuidadosos de filhos incautos, que creem haver bebido a
imortalidade no cálice da juventude.
As
grandes catástrofes carregam em seu script uma pedagogia brutal. Há nelas uma
lição sobre o que não fazer. Sua dissonante partitura se faz com notas que
pedem atenção e reflexão. Desafortunadamente, numa espécie de autodefesa,
cerramos os olhos e os ouvidos. E pouco aprendemos com as lições que nos vêm
dos sinistros e dos escombros.
Por
isso escrevo com a esperança de que a crudelíssima pedagogia dos fatos do dia
27 mostrem aos nossos jovens que nós, os pais, não somos coroas paranoicos a
vislumbrar perigo ali onde tudo indica morar a felicidade e a alegria. Por
isso, escrevo confiando em que os jovens não pressuponham que as autoridades
fazem sempre, em toda a parte, tudo o que lhes compete para garantir a sua
segurança.
Não!
Muitas vezes, é o contrário. Por isso escrevo desejando que os jovens, diante
de tão sofrida experiência, valorizem o dom maravilhoso da vida como uma dádiva
frágil a exigir prudência e atenção. As alegrias dos filhos serão maiores e as
aflições dos pais serão menores se, doravante, filhos e pais forem severos
fiscais da própria segurança onde quer que estejam.
*ESCRITOR
30
de janeiro de 2013 | N° 17328
ARTIGOS
-Nilson Vargas*
A terceira
lista
A
filha da Mauren, os dois sobrinhos do Betinho, a enteada do Diomar, três amigas
da Tayani. Foi assim, carregadas de conexões que formam uma teia de lembranças
de amigos e de passagens da minha vida, que as notícias sobre mortos foram
chegando.
As
dores da minha estimada colega de aula no primário, do meu companheiro de
futebol da juventude, do meu colega de faculdade, da minha querida afilhadinha
foram se somando para compor a minha dor – que me fez chorar muito nas duas
madrugadas que se seguiram ao fato e no trajeto solitário que fiz de carro
entre Santa Maria e Porto Alegre na manhã de terça-feira.
Cheguei
ao local por volta das 5h da manhã. Não vou me deter em relatos do que vi. Eles
já foram dados em textos, fotos, imagens, testemunhos a que desde então todos
tiveram acesso. Ali encontrei outro amigo de infância de quem só lembro o
apelido: Chico Rico. Militar do BOE, ele acabava de sair de dentro da boate e,
depois de um “lembro de ti, sim”, me preveniu de que havia “muita gente morta
lá dentro”.
A
informação dada pelo parceiro de futsal nas quadras do Clube 21 de Abril, no
bairro Itararé, me fez entender que, como jornalista, estava assumindo uma
missão numa cobertura ampla e complexa. E, como pessoa, mergulhava num drama
àquela altura difícil de dimensionar. Meu desafio pessoal, que creio estar
cumprindo: separar a missão do jornalista, que requer equilíbrio e
profissionalismo, do drama do santa-mariense, que, em 46 anos de vida, nunca
havia visto a sua cidade tão triste.
Pela
soma de dramas de pessoas conhecidas, por um drama de alguém que perdeu um
filho ou por algum outro motivo, a cidade começava a ser engolfada por uma
espiral de sentimentos que, aos poucos, iriam surgindo. Primeiro o terror de
quem viveu aquele pesadelo, depois o choque de quem tomou conhecimento, seguido
das muitas modalidades de dor que brotaram em cada um e que alimentaram uma
onda de solidariedade, esta sim digna de orgulho. E não demorou para germinarem
as dúvidas sobre o que teria conduzido àquele episódio horroroso, alimentando,
finalmente, a cobrança por investigação, punição e justiça.
Tudo
isso em meio a uma dolorosa sequência de reconhecimento de corpos, velórios
coletivos, enterros que dilaceravam parentes e amigos. Cenas que transformaram
a tragédia de Santa Maria num drama planetário propagado em imagens e notícias.
A cidade universitária virara um exemplo de duas situações paradoxais: como não
deve ser um local de festas para jovens e como um povo solidário consegue ao
menos atenuar o que aquela música descreve como “a dor de arrumar o quarto do
filho que já morreu”.
Santa
Maria se orgulha de uma lista divulgada todo ano: o listão dos aprovados no
vestibular da UFSM. O orgulho é tanto que os nomes são lidos no rádio, um a um,
com pausada alegria, em cadeias que chegam a incluir emissoras de SC, PR, MS...
Estados que enviam milhares de seus filhos para estudar na cidade. À divulgação
do listão se segue uma onda de festas, cumprimentos, alegria, faixas exibidas
nas sacadas e janelas das residências.
Na
tragédia da boate, outra lista, também lida nas rádios e TVs, desta vez com
pausada tristeza. Muitos dos mais de 230 nomes já haviam figurado num listão da
UFSM, mas não tiveram a chance de buscar o diploma e tocar a vida em frente.
No
abismo de sentimentos que separa o listão dos aprovados da lista dos mortos,
somente uma terceira lista, cujo tamanho não se sabe mas cujo prazo de
divulgação precisa ser abreviado ao máximo, poderá aplacar o vale de lágrimas e
de dor. É a lista dos culpados. Ela não trará de volta os tesouros da Mauren,
do Betinho, do Diomar e da Tayani. Mas é o mínimo que o poder público pode
fazer em resposta ao que aconteceu e que, mesmo com muito esforço, não será
possível esquecer.
*JORNALISTA
E SANTA-MARIENSE
30
de janeiro de 2013 | N° 17328
PAULO
SANT’ANA
O meu
Salieri
Foi
divertidíssimo ler a página do David Coimbra de domingo passado em Zero Hora.
Ele
escreveu que todos os dias assiste a pessoas serem besuntadas com o adjetivo de
gênio, quando na verdade gênio era só o Mozart.
Qualquer
criança de colégio sabe que o David se referia aos leitores que me chamam de
gênio insistentemente. E isso causa urticária no David, como ele próprio
escreveu.
Ele
não tolera que chamem de gênio qualquer colega dele de jornal.
Foi
bom o David lembrar o célebre compositor Mozart, porque me fez recordar
Salieri, o compositor da época que afrontava e não reconhecia Mozart.
É
que, com sua renitência à palavra gênio nos dias de hoje, o David acaba se
consagrando como o meu Salieri. Eu comparo o Coimbra ao Salieri, que, como o
filme Amadeus mostrou, não tolerava que a Europa chamasse Mozart de gênio.
Gozado,
eu não me irrito quando leitores chamam o Luis Fernando Verissimo de gênio. E
até por isso procurei o Verissimo no outro dia, dou como testemunha a mulher
dele, a Lúcia, e disse-lhe que quando o chamam de gênio eu me orgulho por ser
10 vezes mais lido do que ele em ZH, o que no entanto não autoriza ninguém a me
chamar de decagênio.
Mas,
pensando bem, acho que é justo comparar o David ao Salieri. Porque estou assim
reconhecendo que ele está entrando para a história atual no exato lugar do
Salieri: o placê do páreo.
É
preciso que se diga que Salieri tinha algum talento e um certo brilho, deu azar
porque nasceu na época do Mozart.
Só
sabem os gremistas da importância do jogo de hoje na Arena. Se o Grêmio vier a
tirar dois gols de diferença em vitória sobre a LDU, estará garantido na
Libertadores para o próximos meses e ele e a OAS ganharão rios de dinheiro.
Se,
no entanto, o Grêmio não se classificar, restará a ele um ano monótono como o
do Internacional.
Então,
o jogo de hoje é decisivo para o futuro do Grêmio sob a batuta do Fábio Koff,
que tem fama de laureado.
Mas
há um fato que não tem explicação. É até natural e explicável que nesses
primeiros jogos na Arena haja confusão para aquisição de ingressos, localização
de boxes no estádio e outras complicações.
O
que não se pode aceitar de forma alguma é que o gramado da Arena esteja péssimo
para a prática do futebol.
O
gramado é o equipamento mais importante de um estádio de futebol. E o agrônomo
que cultivou o gramado da Arena é no mínimo um desastrado. Como é que ele, com
tanto tempo que teve para plantar o gramado, apresenta-nos um areão daqueles?
Não
tem explicação. É a pedra no sapato do Grêmio nesta decisão.
terça-feira, 29 de janeiro de 2013
29
de janeiro de 2013 | N° 17327
FABRÍCIO
CARPINEJAR
A paixão acontece
Se
você recusou sua rotina, deixou de fazer aquilo que mais gostava em nome de
alguém, torrou seus bens, abandonou os amigos e os prazeres mais fundamentais,
isso não é amor, é paixão.
A
paixão é uma fatalidade, o amor é uma escolha.
A
paixão é egoísta, o amor é generoso.
A
paixão é renúncia, o amor é recomeço.
A
paixão arrebenta, o amor adapta.
A
paixão é confinamento, o amor é abrigo.
Não
há paixão pequena, paixão simbólica, paixão discreta: é grandiosa no início e
escandalosa no final.
Não
recomendo, muito menos desaconselho: é experiência para os fortes.
Nada
do que viveu antes terá sentido, nada do que possa viver depois terá sentido. Conjugará
interminavelmente o presente do indicativo.
Atingirá
um extremo emocional perigoso: você passa a ser do outro em tempo integral. Conhecerá
sua pior crise de nervos, seu mais fundo estresse emocional, seu mais absurdo
esgotamento da memória, sua mais humilhante falência financeira.
Uma
vez apaixonado, você rejuvenesce 10 anos em 10 horas. Mas, uma vez
desapaixonado, você envelhece 10 anos em 10 horas.
A
paixão ou é imensa, ou não é. Ela não pede desculpa, não negocia: equivale a
uma dependência química em seu estado mais selvagem.
É o
equivalente ao sequestro de uma vida. A própria vida. Você é o sequestrador e o
refém ao mesmo tempo.
Não
há desconto, adiamentos, pechincha. A paixão exige pagamento à vista, execução
sumária.
Nunca
vi nenhum apaixonado transferir compromisso para o dia seguinte, ele somente
antecipa.
Não é
que a paixão seja rápida, é devastadora, não sobra coisa alguma para continuar.
O
apaixonado não abre negócios, mas fecha portas. Não areja a cabeça, não tem
grandes ideias, não combate preconceitos, emburrece progressivamente, a ponto
de só ter um número para ligar e um lugar para ir.
Ele
não tem sangue-frio, não raciocina, não elabora planos, não arruma álibis.
A
paixão é um crime malfeito, facilmente descoberto.
Os
envolvidos desprezam o mundo, não se importam se estão sendo vistos, se beijam
em público, se são casados, noivos ou recém-viúvos, se serão criticados pelos
vizinhos e familiares.
O
apaixonado joga tudo para o alto e não fica para segurar nada.
Ele
não tem discernimento, não lê jornal, perde sua capacidade de decidir sobre a
trajetória. Apresenta a superstição de um velho, a intuição de uma criança.
É um
idiota sábio. Idiota porque não se defende da tristeza, sábio porque não se
protege da alegria.
Não
existe mais bom e ruim, certo e errado, esquerda e direita. Não tem sentido
julgar. Não tem como se orgulhar do que foi realizado, muito menos se
arrepender.
Você
muda de personalidade, larga trabalho, descuida da família para se dedicar
inteiramente a não pensar e somente sentir.
Não
podemos nem dizer se a paixão ajuda ou atrapalha, ela acontece.
É uma
tragédia feliz, uma sorte azarada.
29
de janeiro de 2013 | N° 17327
ARTIGOS
- J.J. Camargo*
A pior dor
As
grandes tragédias nos comovem porque nos transportam para dentro delas. E
ficamos lá, durante dias, embalados pela discussão dos detalhes, pela tentativa
infrutífera de reparar e, quando nos convencemos por exaustão de que nada mais
é remediável, nos vemos a discutir os culpados, a criminosa falta de
responsabilidade na emissão dos alvarás e as penas que deveriam receber. E
ficamos indignados porque nada muda e, quando se repetir, sairemos outra vez
atrás de novos culpados.
Mas
nada disso passa nem perto dos sentimentos dos que perderam, porque a dor da
perda é única e indescritível. A perda verdadeira e definitiva.
No
máximo, podemos imaginar a partir de retalhos capturados nas declarações, o
tamanho do sofrimento, mas não o sofrimento coletivo, porque este é sempre
passageiro, mas o sofrimento individual, de cada pai e de cada mãe, que foram
despertados com o relato de uma tragédia e descobriram petrificados que as
luzes embaixo das portas continuavam acesas, porque seus filhos amados não retornaram
da noitada.
Imaginem
a saída para a rua depois de dezenas de telefonemas inúteis e a descoberta de
que havia três possibilidades: mortos estendidos no piso de ginásio municipal,
feridos hospitalizados em Santa Maria, feridos mais graves encaminhados para
Porto Alegre.
Por
onde começar a investigar, no meio de um tumulto, onde estariam a Bruna, o
Rafael ou o Eduardo, se todas as pessoas gritavam e ninguém tinha uma
informação confiável?
Quando
a imprensa acessou o ginásio, reportou que corpos acomodados na lona preta
pareciam intactos, visto que a maioria morreu asfixiada e não por queimaduras.
Mas o que mais impressionou foi o relato de que os celulares seguiam tocando
incansavelmente nos bolsos dos mortos.
E,
quando um repórter tomou um deles, havia um registro a documentar todo o
desespero, a perseverança e a incredulidade: “103 chamadas não atendidas”.
E no
alto da tela o nome mais previsível: MÃE.
*MÉDICO
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