domingo, 30 de julho de 2017





Sexo com robôs

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Boneca Real Doll, robô humanoide usado para fazer sexo
Boneca Real Doll, robô humanoide usado para fazer sexo
Crimes precisam produzir vítimas reais ou só desafiar uma ideia cara à sociedade já é suficiente para caracterizar o delito? Faço essa pergunta a propósito do interessante estudo "Our Sexual Future with Robots", assinado por Noel Sharkey e colaboradores, em que esses especialistas em robótica levantam problemas relacionados à comercialização de robôs sexuais. Para eles, é preocupante a perspectiva de que pedófilos possam encomendar peças com traços infantis, por exemplo. Os eticistas pedem que governos considerem desde já legislar sobre questões como essa.

Sou fã de especulações éticas, mas essa me parece despropositada. A menos que julguemos que o ser humano tem obrigações morais para com computadores, o que não está nem nos sonhos dos entusiastas da inteligência artificial, não há problema algum em estuprar androides ou cortá-los em pedacinhos. Fazê-lo não difere de desmontar uma torradeira.

Como a pedofilia robótica não produz vítimas reais, defender que ela seja considerada crime tem como pressuposto acreditar que o simples ato de nutrir desejo sexual por crianças e adolescentes já merece punição. Até acho que muita gente pensa assim mesmo, mas não me parece que isso seja compatível com uma legislação moderna e racional.

Não dá para tentar controlar pensamentos e desejos. Só o que o Estado pode legitimamente aspirar é a banir comportamentos antissociais que causem prejuízo a terceiros. Na ausência do dano, não dá para falar em crime, por mais repulsiva que seja a conduta. Não é por outro motivo que as leis contra a pedofilia proíbem apenas a produção/guarda de imagens que envolvam menores em situações sexuais, mas não peças de ficção que têm como matéria-prima apenas a imaginação do autor.

A sociedade deve fazer tudo o que estiver a seu alcance para reduzir os crimes sexuais, mas não deve imaginar delitos onde eles não existem. 



Brazil über alles

Avener Prado - 17.nov.2014/Folhapress
Superintendência da PF em Curitiba, onde começou a Lava Jato
Superintendência da PF em Curitiba, onde começou a Lava Jato
Já chamaram o dinheiro de "excremento do demônio". O filho de um imperador romano reclamou do pai o imposto criado para o uso dos mictórios e latrinas. O pai respondeu: "pecunia non olet", ou seja, o dinheiro não cheira. Agora em tempos de Lava Jato, surgiu a expressão "dinheiro sujo". No fundo, todos têm razão.

Não é exatamente uma definição nova. Na década de 1980, me pediram um roteiro para um filme sobre um inglês que assaltou um trem e fugiu para o Brasil. A Fundação Konrad Adenauer pediu a extradição do criminoso, que se casou com uma brasileira e teve um filho com ela. O pedido foi negado e o ladrão prosperou como guia turístico das verdes matas e das fontes murmurantes.

Fiz o roteiro, estive na Alemanha diversas vezes e afinal me pagaram em marcos. Quando fui descontar o cheque, o funcionário que me atendeu examinou bem a nota e nada me pagou, dizendo que aquele era "Das ist schmutziges Geld". Ou seja, dinheiro sujo.

Como se pode ver, o dinheiro é desprezado em todo o mundo, mas todo mundo luta ou rouba pela "coisa suja", que fede e faz parte da fisiologia do demônio. No Brasil, em forma de propina ou outros macetes, o dinheiro serve para tudo, obras, estradas, cargos, túneis e compra de consciências. Só o diabo conhece o preço em reais ou dólares que movimenta a estrutura e o funcionamento das propinas. Tudo em forma de dinheiro sujo.

"Brazil über alles." Se o interessado somar todas as propinas e roubos do dinheiro nacional, obterá uma fortuna maior do que o produto interno bruto.

Pode-se contestar as quantias que a mídia e os peritos da Justiça divulgam quase diariamente. Mas aí surgem o habeas corpus, as prisões domiciliares e as tornozeleiras eletrônicas. Realmente, o Brasil está acima de tudo. 



Dunquerque, a vitória da civilização

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Fionn Whitehead em cena do filme 'Dunkirk
Fionn Whitehead em cena do filme 'Dunkirk'
"Dunkirk" é um grande filme e conta o resgate do exército inglês encurralado na praia francesa de Dunquerque em maio de 1940. Barra pesada, mostra com maestria a angústia da operação.

O filme restringe sua narrativa ao que acontecia na praia, no ar e no mar. Vale a pena por si, mas está nas livrarias "Cinco Dias em Londres", do historiador John Lukacs, publicado em 2001. Juntos, são um presente para a alma. Naqueles dias, tudo parecia perdido. Hitler dobrara a França e era senhor da Europa. O povo inglês ainda não sabia, mas 250 mil soldados estavam cercados na praia de Dunquerque. O colapso dessa tropa seria o prelúdio de uma invasão da ilha.

Winston Churchill ainda não completara duas semanas como primeiro-ministro. Era um político mal visto, falastrão e pouco confiável. Seu rival no partido conservador era o ministro das relações exteriores, Lord Halifax, um inglês de anúncio de roupa, amigo do rei. Halifax queria explorar o caminho de uma paz com Hitler, usando os bons ofícios do embaixador italiano em Londres.

"Cinco Dias em Londres" conta o embate desses dois patriotas. Churchill não queria ceder e costurou sua posição no ministério, até que prevaleceu, depois de uma conversa no jardim com Halifax. (Nenhum dos dois escreveu uma só linha a respeito desse passeio.) Churchill achava que só tiraria 50 mil soldados de Dunquerque. No dia 6 de junho, a Marinha e os pequenos barcos ingleses que atravessaram o canal da Mancha resgataram 338 mil soldados, inclusive 125 mil franceses.

Christopher Nolan fez seu serviço de cineasta e é o vermute. John Lukacs, como historiador, é o gim. Quem junta os dois faz o martíni e revisita uma semana que ajudou a salvar a civilização. Naquele 6 de junho, Churchill, terminado o resgate, fez seu famoso discurso do "nós nunca nos renderemos". Cinco anos depois a Alemanha rendeu-se.

Lukacs sustenta que o nazismo foi vencido em Stalingrado e no Dia D, com o desembarque dos Aliados, mas foi em Dunquerque que Hitler perdeu a sua guerra. Ele, e muita gente boa, inclusive no Brasil, achava que os ingleses negociariam uma paz, nos termos de Berlim.

No dia 21 de maio, Getúlio Vargas escreveu em seu diário: "As notícias da guerra são de uma verdadeira derrocada para os Aliados. O povo, por instinto, teme a vitória alemã; os germanófilos exaltam-se. Mas o que ressalta evidente é a imprevidência das chamadas democracias liberais..."
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Entre os patos de 1972 estavam os militares

Um documentário de Stefanie Dodt e Thomas Aders mostrou ao público alemão as relações promíscuas da Volkswagen com o aparelho repressivo da ditadura brasileira. A Volks não foi a única empresa a denunciar trabalhadores, mas é a única que está sendo cobrada no seu país. O problema da Volks era pedir desculpas. Agora surgiu outro: ter que se desculpar por não ter se desculpado.

Essa questão mostra a saudável relação da sociedade alemã com suas grandes empresas. Nada parecido acontece em Pindorama. A Federação das Indústrias de São Paulo, a Fiesp do pato amarelo, jamais pediu desculpas por ter organizado o caixa dois da guarnição militar de São Paulo.

Uma carta do embaixador americano William Rountree ao Departamento de Estado mostra que no início de 1972 os empresários que vinham sendo arrebanhados pela Fiesp tiveram medo de abandonar o esquema. Eles fizeram saber ao embaixador que "tinham ido muito longe para poderem recuar e achavam que, se o fizessem, prejudicariam seriamente suas relações com a Federação das Indústrias". Afinal era ela quem coletava o dinheiro.

A Fiesp financiou a repressão e bajulou os militares até que os ventos mudaram e criaram-se outras caixas, umas coletivas, outras individuais.

Consultoria de Kissinger faturou US$ 5 milhões; a de Meirelles, R$ 217 milhões

Jorge Araujo/Folhapress
O ministro da Fazenda Henrique Meirelles
O ministro da Fazenda Henrique Meirelles
NÚMEROS E GRIFES


O repórter Filipe Coutinho revelou que entre 2015 e 2016 a empresa de consultoria do ministro Henrique Meirelles faturou R$ 217 milhões, ou cerca de US$ 60 milhões. Em nota, o ministro informou que nesses ganhos estavam incluídos serviços prestados ao longo de quatro anos.

Em 2011, o mundo veio abaixo quando revelou-se que Antonio Palocci faturara R$ 20 milhões com sua empresa de consultoria, num só ano.
Na vida pública, Palocci fora ministro da Fazenda de 2003 a 2006. Sua experiência anterior era a de prefeito de Ribeirão Preto.

Meirelles foi presidente do Banco Central de 2003 a 2011. Ao contrário de Palocci, fez invejável carreira na iniciativa privada, tendo presidido o Banco de Boston.

Uma das mais famosas firmas de consultoria de grife do mundo, a do ex-secretário de Estado americano Henry Kissinger, não revela seus números. Em 1986, quando ele ainda estava no auge da forma e da fama, soube-se que ela faturou US$ 5 milhões.

A empresa de Kissinger tem a sua grife, mas nela estiveram craques como Timothy Geithner, o celebrado secretário do Tesouro de Obama durante a crise financeira mundial.

CARGO VAGO

Estão no mercado dois dos empregos mais prestigiosos do mundo, a presidência da Universidade Harvard e a diretoria do museu Metropolitan de Nova York.

A escolha do museu é feita num mercado restrito, mas Harvard circulou um pedido de indicações. Não é nada, não é nada, o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, poderia se oferecer para indicar os nomes de alguns deputados da base governista.
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Comunidade brasileira em Portugal encolhe


Há cada vez menos brasileiros com visto de residência em Portugal. Em 2016, pelo sexto ano consecutivo, houve um decréscimo no número de cidadãos do Brasil com esse tipo de autorização.

Embora os brasileiros continuem sendo, com folga, a maior comunidade estrangeira no país –20,4% do total–, nossa participação vem diminuindo. De 2010, recorde histórico, até 2016, há 38.112 brasileiros menos residindo em Portugal –uma redução de 31,9% no período.

As informações constam na edição mais recente do Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilos elaborado pelo SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), órgão responsável pela imigração no país.

A quantidade total de estrangeiros em Portugal, porém, voltou a crescer após seis anos em queda. O aumento foi puxado principalmente por cidadãos de outros países da União Europeia.
Embora as estatísticas digam que a imigração diminuiu, há um contingente significativo de brasileiros que não é contabilizado. É o caso dos que têm também cidadania portuguesa ou de outro país da UE, que não precisam do visto de residência. E nunca tantos brasileiros obtiveram a cidadania portuguesa como agora. Desde 2010, foram quase 90 mil.

O Consulado-Geral de Portugal em São Paulo é o que mais emite cidadanias portuguesas no mundo. Só em 2016, foram 7.413 novos portugueses, ou 20,3 cidadanias concedidas por dia. Um aumento de 231% em relação a 2005, quando foram atribuídas 2.235 nacionalidades.

No outro extremo da "invisibilidade" estão os imigrantes ilegais, que também não aparecem nas estatísticas.

De acordo com o relatório das autoridades portuguesas, a crise econômica no Brasil reacendeu o fluxo de permanência irregular. Tanto é que, em 2016, a quantidade de brasileiros barrados nos aeroportos portugueses praticamente dobrou em relação ao ano anterior.

Embora o primeiro-ministro António Costa tenha reiteradamente afirmado ser a favor da chegada de brasileiros, o governo do socialista endureceu as regras de legalização para estrangeiros.

Uma das vias mais usadas por brasileiros para se regularizar –a obtenção de um contrato de trabalho e alguns meses de contribuição para a segurança social– ficou inviável, deixando um grande contingente de trabalhadores sem visto adequado.

MAIS RICOS

Autoridades portuguesas e brasileiras concordam, porém, que o perfil do imigrante vem mudando, e há, entre os que chegam, cada vez mais profissionais qualificados.

A procura de brasileiros por imóveis no país é um bom indicativo deste fenômeno.
Dados da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal indicam que, em setembro, os brasileiros superaram os chineses e tornaram-se a terceira nacionalidade que mais compra imóveis no país.

Números do Banco Central do Brasil indicam interesse crescente pelo país de Camões desde 2012. No fim de 2015, Portugal já era o terceiro país onde os brasileiros mais investiram em imóveis.

A sensação de que brasileiros endinheirados invadem o país já ecoa na mídia lusa. A revista "Sábado" publicou neste mês longa reportagem de capa intitulada "O luxo dos brasileiros em Portugal".

Conheça as diferenças entre vinhos de diferentes lugares do mundo e faça bonito nas conversas

Mick Rock/Divulgação
ORG XMIT: 560801_0.tif Colheita de uvas chardonnay em vinhedo na região da Borgonha, na França. (Mick Rock/Divulgação). *** PROIBIDA A PUBLICAÇÃO SEM AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS ***
Colheita de uvas chardonnay em vinhedo na região da Borgonha, na Franior Menor


30/07/2017 02h00

Cabeçudo, apaixonado, estudioso. Quando você dá "match" com um vinho, isso pode dizer muito.Durante uma tarde, a sommelière Alexandra Corvo, da escola Ciclo das Vinhas, ajudou a sãopaulo na tarefa de ligar "personalidades" às principais uvas e regiões produtoras do mundo.

A ideia é apresentá-las de forma simples e com uma dose de humor —um empurrãozinho para entender melhor como escolher a sua bebida (e com quem quer tomá-la). "É bom sempre observar que o nível de complexidade e qualidade varia de acordo com o produtor dentro de cada região", lembra Alexandra.
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VELHO MUNDO

Com os vinhedos mais antigos, rotula seus vinhos do ponto de vista geográfico; eles podem indicar regiões,cidades e pequenos vilarejos, que produzem sob determinadas regras.
Para os estudiosos: França

Essa é sua praia se você gosta de saber a história de um vinho. Ali nasceu o sistema de denominação baseado na origem, hoje aplicado em toda a Europa. Subdivide-se em diferentes regiões, cada uma com o seu jeitinho. Conheça algumas e escolha a sua.

BORDEAUX

Gosta de impressionar


São famosos os tintos icônicos pela sua estrutura e longevidade feitos (em geral) com corte de cabernet sauvignon e merlot. Tendem a ser estruturados e tânicos, com frutas negras e notas florais no nariz. A combinação local clássica é com carne de caça.

BORGONHA

Busca prazeres refinados


Os tintos (em geral à base de pinot noir) são leves, com notas de frutas vermelhas e flores, taninos delicados e acidez fresca. Bons para carnes e molhos mais delicados. Os brancos têm acidez equilibrada e acompanham queijos de pasta mole e pratos amanteigados.

VALE DO RHÔNE

Tem talento para garimpar


O Sul tem tintos com aromas de frutas maduras e erva secas. É dali que saem ótimas barganhas. No Norte há vinhos intensos à base de syrah, com aroma de violeta, frutas negras e tabaco. Brancos são feitos da uva viognier, rica em aroma de mel

CHAMPANHE

Para um bom entendedor


Só a bebida feita lá pode ser chamada de champanhe. Símbolo da sofisticação, é feita com mistura de variedades (como chardonnay, pinot noir e pinot meunier). Aromas de brioche, pão tostado, giz e cal, com acidez marcante, fazem dela uma bebida mais complexa e exigente.
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Para lusófonos: Portugal

Com uma grande variedade de uvas nativas, como a touriga nacional, o país tem estilos ricos, muito ligados aos climas. A região dos Vinhos Verdes dá brancos refrescantes, enquanto o quente vale do Douro fornece tintos intensos e frutados e brancos gordos e minerais.

As serras frescas do Dão produzem tintos delicados e perfumados e brancos cítricos. O Alentejo, mais quente, dá vinhos com notas de frutas maduras.
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Para os intensos: Espanha

Dominada pela variedade tempranillo (notas de frutas pretas e tabaco) e por clima quente e seco, tem tintos de potência. Conheça as regiões icônicas:

RIOJA

Calorosos


Vinhos tintos intensos, à base de tempranillo, com equilíbrio de acidez e álcool e toque de baunilha. É importante o tempo em barrica de carvalho: de "crianza" (mínimo de seis meses) a "gran reserva" (mínimo de 24 meses).

COSTA MEDITERRÂNEA

Festivos


Nos arredores da cidade de Barcelona está a produção da cava, um espumante que ainda é feito pelo método tradicional. É, em geral, frutado, com um leve toque salino

RIBEIRA DEL DUERO

Para os apimentados


Usa a mesma uva, tempranillo, mas produz vinho mais enérgico, de cor mais escura, mais alcoólico, com frutas negras no nariz, do que os vinhos de Rioja

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Para desbravadores: Itália

É preciso ânimo e coragem para deixar se levar pelas mais de 600 variedades de uvas autóctones (nativas) desse país. Produz uma gama diversa e fascinante de estilos, manifestados em diferentes regiões. Conheça alguns abaixo:

VÊNETO

Apaixonados


Na terra de Romeu e Julieta estão as colinas que produzem o popular Valpolicella, tintos tânicos e leves à base da uva corvina (com aromas de frutas e couro), para quem gosta de picância. Nas cidades de Conegliano e Valdobbiadene está a zona do espumante Prosecco: intenso, frutado, fresco, com toques de maçã e florais. Um clássico da sedução.

PUGLIA

Acalorados


Uma das regiões mais quentes do país é de onde vem a variedade primitivo, com notas de café e cardamomo, que produz vinhos robustos e potentes.

PIEMONTE

Ama um clássico


Terra de alguns dos vinhos mais reverenciados da Itália, Barolo (mais austero) e Barbaresco (com firmeza e também frutosidade presente). Nebbiolo é a variedade que dá estrutura e tanino a ambos. Se quiser algo mais fácil de tomar, vá de Barbera e Dolcetto.

NOVO MUNDO

A partir do século 20, novas regiões vinícolas começaram a surgir fora da Europa. Nesta época, rótulos começaram a indicar o nome da principal variedade da uva usada. Mergulhe nesta tradição.

Para quem sabe o que quer: Argentina

Apesar da malbec ter sua origem na França, o vinho feito com essa uva (de contornos ricos, maduros, aveludados e aromáticos) é a assinatura da Argentina —e sucesso indiscutível entre os brasileiros. A maior parte da produção vem de Mendoza, região quente e seca, onde as vinhas são irrigadas pela neve andina derretida.

O país também produz tintos de outras variedades. Entre os brancos, destaque para os feitos com a uva chardonnay, que são cheios, ricos e alcoólicos.
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Para os prontos para o novo: Brasil

Vinhos pouco conhecidos entre os próprios brasileiros, mas com um grande potencial pela frente. Na Serra Gaúcha está a maior e mais importante região vinícola do país, terra de espumantes que fazem a fama do Brasil.

Outro destaque é o Vale dos Vinhedos, que produz, além de espumantes, tintos de médio corpo e também estruturados. Mais acima, Santa Catarina produz tintos "minerais e longevos e rosés bem estruturados", explica Igor Colleta, do Red Buteco. No Vale do São Francisco, no Nordeste, estão tintos e brancos, com destaque para vinhos feitos com moscatel.

Para ficar de olho: vinícolas paulistas, como a premiada Guaspari, e mineiras, vêm surpreendendo com resultados promissores e inesperados, por sua localização.
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Para os descomplicados: Austrália

Com o início da produção no final da década de 1980, o país tornou-se um dos exportadores mais ativos do mundo, segundo a crítica Jancis Robinson. A shiraz (como ficou conhecida por lá a uva syrah, que nasceu no Vale do Rhône, na França) é a principal variedade.

Produz vinhos com notas de geleias e frutas vermelhas, alcoólicos e macios, capazes de agradar em diferentes situações. Entre os vinhos brancos, estão opções feitas com a uva riesling, marcada pelo frescor, acidez e notas florais.
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Para os enérgicos: EUA

São o quarto maior produtor de vinho do mundo. A Califórnia é a superpotência naquele país. Origina tintos e brancos intensos e frutados, capazes de aplacar a vigorosidade de qualquer um. Sua variedade mais importante é a cabernet sauvignon, como os encontrados no Napa, alcoólicos, com uvas maduras e presença de taninos.

Mas tintos feitos com a uva zinfandel, com notas de frutas secas e especiarias, também ganharam importância ali. Os brancos, que passam em barrica, são cremosos, gordurosos e mais parrudos.
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Para os inseguros: Chile

Porto-seguro da América do Sul e comercialmente robusto, o país conseguiu fazer sua fama entre os brasileiros. Tinha sua produção concentrada ao redor de Santiago, mas está expandindo as fronteiras em direção ao Pacífico, ao extremo sul e ao norte.

Em geral, tem tintos encorpados, tânicos, à base de cabernet sauvignon, com aromas de tabaco, frutas negras e eucalipto. A carmenère, variedade quase exclusiva do país, produz vinhos macios com notas de páprica. Entre os brancos, são boas pedidas os da zona costeira, feitos com uvas clássicas como sauvigon blanc, com aromas vegetais e minerais.

Outras fontes: "Wine Folly - O Guia Essencial do Vinho" (Madeline Puckette e Justin Hammack), "Expert em Vinhos em 24 Horas" (Jancis Robinson) e "Atlas Mundial do Vinho" (Hugh Johnson, Jancis Robinson)

sábado, 29 de julho de 2017


29 de julho de 2017 | N° 18910
LYA LUFT

Antes que os enquadremos

O mundo anda complicado, o Brasil idem. Então resolvo dar ao leitor um brinde carinhoso, logo depois do Dia dos Avós (sim, eu curto essas datas), em que meus sete netos e netas me visitaram – em pessoa ou pelo cyberspace, de várias partes do mundo.

Um menino e sua mãe voltavam das compras no ônibus quase vazio. Ele segurava no colo o presente cobiçado: um microscópio “de verdade”, dado pelo pai, mas a mãe fora com ele comprar. Tinha um ar sonhador, e de vez em quando passava a mão no pacote:

– Parece mentira, né, mãe? – estava encantado, olhar de um azul indescritível. – Mãe, que igreja é essa?

– Nossa Senhora Auxiliadora.

– Por que tem tanta Nossa Senhora? Não era só uma?

– É uma, sim, filho, mas ela tem muitos nomes.

– E o Nosso Senhor é São Pedro, né?

– Não, é Jesus, ora. Quem se casou com ela foi São José. São Pedro era amigo de Jesus – a mãe suspirou: não praticar muita religião dava nisso.

– Ah... e por que o José não é o Nosso Senhor, se era casado com Nossa Senhora? – a mãe foi ficando um pouco inquieta, o ônibus agora atento.

– Acho que é porque Jesus e Nossa Senhora são mais importantes, filho.

– Mas o São José não era o pai dele?

– Não era de verdade, o pai dele era Deus. São José foi o pai adotivo.

– Então Jesus não nasceu da sementinha do São José? – o silêncio no ônibus já meio vazio parecia imenso. O menino falava em voz alta e clara, pra ele era tudo natural, assim ensinavam em casa.



– Não, filho, Deus fez brotar a sementinha direto em Nossa Senhora, foi um milagre.

– Ué, então não foi como nas pessoas? – a mãe se fez de distraída, mas o menino pensava concentrado e não ia desistir. – Mãe, como é que antigamente, beeeeem antigamente, as primeiras pessoas sabiam como se fazia pra ter neném, se ninguém tinha ensinado a elas?

– Ora, filho, essas coisas a natureza ensina.

– Mas a natureza não é pessoa pra ensinar a gente...

– Quer dizer, quando a gente cresce, aprende por si.

Aí ele muda o assunto:

– Mãe, olha, nessa placa estava escrito Rua Mozart! Eu acho que ele mora aqui!

– Ele quem?

– O Mozart, mãe, ora. Quem ia ser?

– Não, filho, ele viveu na Europa.

– Ah é? Até achei que era nos Estados Unidos, porque as pessoas mais importantes do mundo inteiro moram lá.

– Nada disso! Você não está aprendendo piano? Muitos dos músicos mais importantes, e filósofos, e escritores, moram na Europa.

Ele reflete. Depois, incansável perguntador (como a mãe fora em menina),volta à carga:

– Mãe, o que é mesmo a gente ser um filósofo?

– Uma pessoa que pensa muito. Pensa por todo mundo. Ensina a gente a pensar.

– Ah... Meu irmãozinho pensa muito, será que ele é um filósofo?

– Filho, acho que sim, mas todas as crianças são meio filósofas – não acrescentou: “Antes que os adultos as enquadrem”.

Finalmente desembarcaram. O menino retomou seu ar sonhador, ainda segurando o pacote:

– Mãe, como eu tenho um pai bom, né? – e logo acrescentou: – Mãe também, claro.


29 de julho de 2017 | N° 18910
MARTHA MEDEIROS

CIGARETTES AFTER SEX


 “Acho que você vai gostar. É como uma brisa entrando pela janela.” Era o que dizia o e-mail. Apenas essas duas frases e um link, enviados por um leitor que eu não conhecia e do qual não lembro o nome. Normalmente, eu deletaria sem conferir, mas alguma coisa, da ordem do inexplicável, fez com que eu abrisse aquele link que poderia conter um poema enfadonho, uma foto apelativa ou, risco fatal, um vírus que detonaria meu computador. Mas o que havia ali era o som de uma banda chamada Cigarettes After Sex. Desde então, não consigo deixar de escutá-la um só dia.

Foi novidade pra mim, mas talvez não pra você, já que este grupo surgiu em 2008, no Texas, e atingiu o reconhecimento em 2015, no Brooklyn. De qualquer forma, tivemos nossa primeira vez no início deste ano, e falar em primeira vez, neste caso, se justifica, sendo Cigarettes After Sex um título tão sugestivo.

Pouca gente fuma hoje em dia, e, se fuma, é expulso do ambiente quando se atreve. Portanto, o famoso cigarro depois do sexo deixou de ser um hábito para virar um clichê, mas mantém seu significado: após o gozo, é a vez do suspiro – aquele que Mario Quintana disfarçava entre uma tragada e outra.

O cigarro pode ter se tornado metafórico, mas o relaxamento é real. Um relaxamento que uma amiga minha, ao escutar as canções que recomendei, confundiu com tristeza. Ora, o pós-sexo só é triste quando você não está com quem deseja. Se é de amor que falamos, o momento que vem depois da finalização do ato só pode ser comparado com plenitude, languidez, entorpecência. A vida em modo de espera antes de se reconstituir.

Cigarettes After Sex é a tradução musical da penumbra do quarto, do suor dos corpos, dos poros abertos, dos lençóis amarfanhados, da calcinha no chão, das taças vazias. Cigarettes After Sex é câmera lenta, preguiça, sussurros, o barulho da cidade trazendo vestígios longínquos de outro planeta. Cigarettes After Sex é quando se presta atenção no formato das espaldas, na penugem da coxa, nos fios de cabelo grudados no pescoço de quem está ao nosso lado na cama. 

Cigarettes After Sex é quando o relógio para, não é dia nem noite, o celular se mantém silencioso e os problemas se aquietam também. É aquele instante sublime em que não somos pessoa física nem jurídica – apenas espiritual. Cigarettes After Sex é a beleza do nada, a pulsação da calma, a sensualidade do que já aconteceu.

Uma brisa que entra pela janela e nos conduz a alguns minutos de entrega à nossa própria ausência saciada.