10
de agosto de 2013 | N° 17518
CLÁUDIA
LAITANO
Piada de homem
Entre
as muitas diferenças entre um pai e uma mãe, ou entre um futuro pai e uma
futura mãe, inclui-se o IEAV (Índice de Exposição a Anedotas Velhas). Nunca vi
uma mulher fazendo piada sobre o filho que a outra está esperando – não, pelo
menos, daquele tipo que faz parte do repertório masculino semiautomático em
conversas sobre bebês: a de que os pais de meninas vão se tornar “fornecedores”
(hã?) e a de que os pais de meninos só poderão respirar aliviados no dia em que
o guri voltar para casa contando que pegou a mulher mangaba.
Parece
quase pueril imaginar que, entre tantas possíveis inquietações a respeito do
futuro de um filho, a administração da própria sexualidade assuma tanta
importância. Eu, por exemplo, me preocupo com tudo que a minha filha não vai
poder escolher.
Ou
seja, com todos aqueles perrengues que fazem parte da vida de todo mundo, mas
que a gente gostaria de imaginar que, por alguma intercorrência mágica
excepcional, jamais cruzarão o destino das nossas crianças: corações partidos,
frustrações profissionais, acidentes, doenças, sofrimentos em geral – inclusive
o de não estarmos sempre por perto quando eles precisarem. OK, nada disso rende
muito como piada, mas é o que realmente preocupa um pai ou uma mãe, a sério,
quando param para pensar.
Talvez
boa parte dos homens ainda se identifique com pais que não apenas entram em
crise quando descobrem que o filho é gay, mas brigam, rompem relações ou se
esforçam para solenemente ignorar a realidade enquanto for possível. Há já em
curso, porém, uma mudança perceptível de postura de alguns pais – uma pequena
“revolução moral”, na expressão usada pelo filósofo Anthony Appiah (convidado
do próximo Fronteiras do Pensamento).
“Revoluções
morais” são aquelas que transformam práticas que antes pareciam normais em algo
que pega mal, para uma pessoa ou um país – como a escravidão no século 19 ou os
pés amarrados das chinesas no começo do século 20. É provável que um pai que
não acolhe o filho gay torne-se, em breve, algo tão anacrônico quanto o
professor que colocava o aluno desobediente ajoelhado no milho. Tudo indica que
é só uma questão de tempo – pouco tempo.
Para
todos os pais de meninos e meninas gays que vão receber neste domingo não
apenas os seus filhos, mas as escolhas amorosas que eles fizeram, desejo um Dia
dos Pais cheio de alegria e carinho. Não tenho dúvida de que pais que aceitam
os filhos como eles são devem ser a maioria no futuro. Os outros, talvez, é que
vão ter que se cuidar para não virar piada.