terça-feira, 22 de abril de 2014


22 de abril de 2014 | N° 17771
LUÍS AUGUSTO FISCHER

Sem poder dizer

Começo a ler o mais novo livro do Celso Gutfreind e já me entusiasmo: de saída o tom da escrita é o confessional, não o analítico, embora seja o autor um psiquiatra e psicanalista. Os textos aqui reunidos são em grande parte maturações de textos anteriores, o que é mais uma vez animador: um autor que adensa sua maneira de dizer sua perspectiva do mundo merece meu respeito.

Mas o Celso é poeta, antes de tudo e depois de tudo, e por isso a gente vai lendo o escrito com aquela atenção acesa de quem lê poesia, especificamente a poesia tipo a do Celso, que vai de linha em linha, de palavra em palavra, sempre em busca da associação iluminadora, para dizer o que é preciso dizer, para dizer o preciso e o necessário (me contaminei com a dicção do livro, com minhas limitações de não poeta). E vamos esbarrando em frases como esta aqui, que me comove: “Adoecer é no fundo não ter como dizer”.

Bá, Celso.

(Ia esquecendo de mencionar que o livro tem ensaios sobre literatura, despontando uma linda leitura sobre o Salinger do Apanhador no Campo de Centeio, e ensaios sobre psicanálise. O título e o subtítulo descrevem bem: A Infância através do Espelho – A Criança no Adulto, a Literatura na Psicanálise. Editora Artmed.)

Mas, Celso, me diz aí: como é que nós vamos falar dessa morte do menino de Três Passos? No momento em que escrevo, pai e madrasta estão presos, mas ainda não confessaram, e eu não consigo ler nem consigo parar de ler tudo que posso sobre o caso. Não tenho nem como exclamar, nem como calar minha reação.


Celso, eu não sei dizer nada sobre isso, e é certo que vou adoecer dessa incapacidade.