quarta-feira, 27 de agosto de 2014


27 de agosto de 2014 | N° 17904
FRONTEIRAS DO PENSAMENTO

Bondade vem da razão, não das emoções

PSICÓLOGO PAUL BLOOM afirma que a noção de bem e mal que carregamos desde bebês pode ser nociva, se não for controlada racionalmente

O psicólogo canadense Paul Bloom aproveitou o público do Fronteiras do Pensamento para testar, na segunda-feira, no Salão de Atos da UFRGS, um tanto de teses. No telão, um bebê afasta um boneco egoísta e se lança a abraçar um fantoche que sabe dividir brinquedos com os colegas de pelúcia. Ternura na arquibancada. Depois a tela mostra uma senhora que, sem dar pelas câmeras de Londres, apanha um gato na rua e o enfia na lixeira. Porto Alegre protesta: que barbaridade!

– Temos uma capacidade quase perceptual de entender o que é bom e o que é mau – defende Bloom, sustentando que nascemos com uma “empatia instintiva”.

Bloom concede que “nossa vida moral é profundamente influenciada pelas situações em que nos encontramos”, mas, em vez de fraquejar, o professor da Universidade de Yale incorpora isso como prova de que a inteligência deve domesticar o nosso rodapé moral. Deixada à solta, a “empatia instintiva” vira ameaça de morte a quem mete gatos no lixo ou, puxando exemplo de cá, o linchamento coletivo do suspeito:

– Temos um impulso poderoso de punir o que vemos como errado. Nossa empatia programada é tragicamente limitada – observa o psicólogo, que detectou nos bebês um ranço irracional contra desconhecidos, nascedouro, por hipótese, de atitudes como a do racista e a do homofóbico.

HISTÓRIAS PARA VENCER A TENDÊNCIA À INDIFERENÇA

Nos testes de Bloom, ao repartir recursos com uma criança estranha, a gurizada preferia igualdade na pobreza a desigualdade na abundância, para não ver o outro ficar com uma fatia maior do bolo. Uma solução seriam narrativas que ensinam o sofrimento alheio – se somos indiferentes à notícia que anuncia milhares de mortos lá longe, sucumbimos à história isolada de uma vítima. Para Bloom, essa via vai pela trilha incerta da emoção, má baliza para a moralidade:

– Devemos confiar não nas emoções, mas na razão, que pode passar por cima das paixões e construir leis que reprimam nossas emoções. Não somos naturalmente compassivos com o estranho, vamos sempre precisar de uma força externa para nos tornarmos pessoas boas – completa.

Se, no início do mês, o físico Geoffrey West aplicou às cidades uma tradução estatística do idealismo de Platão, ontem o Salão de Atos avançou uns séculos e assistiu à proposta iluminista de reformar o homem pelo esclarecimento. Crentes na ciência, as duas palestras não passaram sem aviso prévio. No clipe de abertura, Mia Couto sempre vem dizer que “precisamos de uma forma radical de repensar o próprio pensamento”.

O Fronteiras do Pensamento é apresentado pela Braskem e tem o patrocínio de Unimed Porto Alegre, Gerdau e Hospital Mãe de Deus. Parceria acadêmica da UFRGS e parceria cultural de Natura, PUCRS e Celulose Riograndense. Promoção Grupo RBS.


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