Sarney, o maior cabo eleitoral de
Marina
Marina celebrou o ataque dele.
Ninguém sabe a cara da nova política – e todos conhecem a velha
RUTH DE AQUINO
19/09/2014 21h02
Não será o retrato do Brasil
atual que elegerá Dilma, Marina ou Aécio. Cada candidato extrairá da última
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) os números que melhor
sustentam seus discursos.
Não será o beijo de Chico Buarque
na mão de Dilma que a reelegerá. Não será o beijo de Gilberto Gil na testa de
Marina que elegerá aquela que passou fome na infância e se desgarrou do PT. Não
será o apaixonado apoio das socialites que elegerá o tucano Aécio.
Não são os programas de governo
que decidirão tampouco, porque, até sexta-feira, nem Dilma nem Aécio haviam
tido a coragem de expor suas propostas. Não serão os evangélicos, os católicos
ou os ateus que elegerão o novo presidente. Não serão os gays. Nem os héteros.
Não serão as mulheres pró ou contra o direito ao aborto. Não serão os
ambientalistas ou os devastadores da floresta. Não serão os banqueiros – esses
então, nunca! Mesmo que seus lucros tenham batido recordes nos 12 anos de PT,
os banqueiros são os piores cabos eleitorais neste Brasil hoje estagnado e com
algumas bombas-relógio armadas por Dilma.
Não serão, claro, os jornalistas
que elegerão o próximo presidente, num país que continua com 13 milhões de
analfabetos, além dos 30 milhões de analfabetos funcionais, com dificuldade
para interpretar um texto. O PT e os militantes totalitários que acusam a
imprensa de “fascismo” esquecem que Lula foi incensado pelos mesmos jornais que
estão aí hoje, ao ser eleito em 2002. Havia, na imprensa, a rejeição da
estratégia falaciosa do medo – a mesma que Dilma usa hoje contra sua maior
adversária, Marina.
Lula encarnava uma imensa
esperança de o Brasil se tornar mais ético, com uma “nova política”, ancorada
na ética e na honestidade. A palavra ética desapareceu para sempre dos
programas e das bandeiras do PT. É muito improvável que figure no programa de
Dilma. Cara de pau tem limite.
O eleitor, com fé e razão,
esperava com o PT um Brasil que investisse pesado em educação, saúde,
transporte, segurança e infraestrutura. Um Brasil cujo governo não escondesse
dólares na cueca, na bolsa, no banco do carro, na valise. Um Brasil em que a roubalheira
não se tornasse institucionalizada, e os desvios de verba pública não se
tornassem tão corriqueiros, enlameando até a Petrobras.
Um Brasil que valorizasse a
meritocracia, em vez de criar uma casta de “sindicalistas aspones” milionários.
Um Brasil que não transformasse corruptos em conselheiros do Poder. Que não
criasse mais de 30 Ministérios e mais de 20 mil cargos comissionados na
administração direta. Esperávamos um Brasil que não trocasse projeto de governo
por projeto de poder, em que o fim justifica os meios.
Será que, como diz Dilma, se
Marina for eleita, “banqueiros” farão desaparecer a comida da mesa dos
brasileiros? Dilma apoiou a autonomia do Banco Central em 2010 e já percebeu
que exagerou ao transformar Marina na “exterminadora do futuro”. Onde está a
Comissão da Verdade?
Nesse vendaval de mentiras, só
engolidas pelos desinformados ou de má-fé, apareceu, nas hostes do governo, o
maior cabo eleitoral de Marina até agora: José Sarney. “Dona Marina, com essa
cara de santinha, mas (não tem) ninguém mais radical, mais raivosa, mais com
vontade de ódio do que ela. Quando ela fala em diálogo, o que ela chama de
diálogo é converter você.” Sarney estava em São Luís, no palanque de Lobão
Filho (PMDB), filho do ministro Edison Lobão, candidato ao governo do Maranhão
com seu apoio e de sua filha Roseana.
Sarney foi chamado por Lula, em
1986, de “grileiro do Maranhão” e, em 1987, de “o maior ladrão da Nova
República” – perto de Sarney, Maluf não passava de “um trombadinha”. Com Lula
eleito, viraram irmãos de sangue, prontos a duelar um pelo outro. Sarney
sobreviveu incólume a acusações de improbidade, em três mandatos do PT, com a
bênção e o beija-mão de Lula e Dilma. Tornou-se o coronel da Casa Grande de
Brasília, o “homem incomum”. Imagino como Marina comemorou a declaração de
Sarney.
Ninguém sabe direito a cara da
nova política, mas todo mundo conhece a cara da velha. O mínimo que se pede ao
novo presidente é honestidade. Dilma deve implorar a Collor que não a defenda
em público e não ataque Marina. É que pega mal. Já chega o Sarney.