30
de setembro de 2014 | N° 17938
LUIZ
PAULO VASCONCELLOS
GPS GAZA
São
muito raros hoje em dia os espetáculos de teatro que abordam, direta ou
indiretamente, os problemas que assolam o país e o mundo. Alguém viu nos
últimos tempos alguma peça que falasse em corrupção e impunidade? Alguém viu
recentemente num palco algum personagem discutindo vandalismo ou racismo? Ah,
sim, tem Hamlet e Otelo, mas foram escritas no século 17...
Esse
talvez seja o principal mérito da montagem de GPS Gaza, estreada durante o 21º
Porto Alegre Em Cena. Concebido por Camila Bauer e Deborah Finocchiaro, o
espetáculo se inspira, de forma contundente, embora às vezes com fantasia e
ironia, na situação de violência entre árabes e judeus em eterna disputa pela
extensão de terra na costa oriental do Mar Mediterrâneo chamada Faixa de Gaza.
O
texto é composto por fragmentos de contos, músicas, entrevistas e outras
referências jornalísticas e dramatúrgicas, particularmente das peças de Caryl
Churchill e Deb Margolin, textos que conduzem o espectador a pensar em seu
próprio universo, seus valores, sua ética, suas crenças e descrenças. E, num
período em que tudo se resume a cavaletes com sorrisos hipócritas espalhados
nas ruas de todas as cidades do país, pensar pode ser uma boa opção.
A
direção de Camila Bauer é sutil e ao mesmo tempo impactante, provocando
momentos de reflexão sobre a faixa de Gaza que cada um carrega dentro de si,
aquela área polêmica em eterno conflito entre tolerância e intolerância, teísmo
e ateísmo, dogmas e o direito à liberdade de escolhas. A iluminação de Carol
Zimmer e a trilha sonora de Fernando Mattos e Kevin Brezolin dão relevo às
imagens criadas pelos vídeos de Luiz Alberto Cassol e às interpretações de
Deborah Finocchiaro e da atriz convidada Sandra Dani.
O espetáculo
volta a cartaz de 3 a
26 de outubro, na Sala Álvaro Moreyra do Centro Municipal de Cultura da
Capital. Acho que vale a pena se arriscar num bom espetáculo e, principalmente,
a pensar, seja qual for o resultado das eleições e o destino dos milhares de
cavaletes que ainda permanecem debochando de nós.