21
de setembro de 2014 | N° 17929
FABRÍCIO
CARPINEJAR
O coração
cuspindo
Quando
você não tem como resgatar uma história de amor, meu amigo, meu irmão, o
coração vai cuspindo.
O
coração está gripado. Está doente. Você respira bem, mas o coração não. Não
criaram uma aspirina para o coração. Não tem como tomar um remédio. Ou esquecer.
Seu
coração cospe o nome dela, as imagens dela em cada tentativa de romance.
As
mulheres com quem vai sair não notarão o seu peito apertado. O seu peito
confrangido. O seu peito constrangido. O seu peito doendo a falta de esperança.
Mas, entenda, seu coração vai cuspir muito ainda. Talvez seja pneumonia do
coração.
Seguirá
com a vida porque não tem o que fazer: ela arrancou o futuro da relação, a
esperança, ela não mudará, continuará lhe destratando, sendo grosseira, muda,
fria, insensível.
Ela
não dará jamais as respostas que deseja. A saúde que espera. O arrependimento
que anseia. Cuspirá, meu querido. Nas calçadas e nos canteiros, cuidando para
não ser visto.
Um
exorcismo que não termina, fracassando para jogar fora o excesso não vivido a
dois. Sofre da nostalgia do que não viveu e não viverá mais.
Ela
não merece seu amor - o que agrava a sua angústia. Pertencimento e merecimento
não andam lado a lado, descobriu isso, infelizmente.
Você
já cansou de rezar. A tosse é o cansaço da memória. O cansaço do silêncio. O
cansaço de Deus. O cansaço da insistência: esta insistência cansada na
desistência. O amor pulsa inteiro entre palavras quebradas. O amor bate inteiro
com a fé estraçalhada.
Tudo
foi piorando de tal forma que ou você afundava junto com ela, humilhado, ou
você emergia, sozinho e ferido. Todo amor a uma mulher deve coincidir com o
amor à vida.
Seu
coração tosse quando janta acompanhado em um restaurante diferente e percebe
que sua ex poderia gostar de um prato, da decoração, quando seu pedido no
cardápio é mais o pedido dela do que o seu, quando você tem vontade de sair
dali para contar para ela que precisa conhecer um novo restaurante, que é a sua
cara.
Mas
ela não escutará você. Porque estará de mau humor, estará cobrando novamente,
sempre insatisfeita, sempre infeliz. Você tentou fazê-la feliz e ela somente
lhe machucou.
Já
conclui que ela odeia sua felicidade, ama seu amor e odeia sua felicidade. Não
dará importância à sua poesia, aos seus detalhes, ao tempo que leva reunindo a
saudade de lugar a lugar para oferecê-la.
Seu
coração tosse sem parar quando busca se envolver com uma pretendente. Depois da
euforia do sexo, da inconsciência do sexo, ficará com uma vontade imensa de se
isolar e mandar a companhia embora. Terá que ser educado para disfarçar a tosse
e não transmitir a sensação que usou a pessoa. Você vem se usando, não usando
ninguém.
A
tosse é indelicada e convence seu rosto a mergulhar na tristeza. Não consegue
conversar, pois seu coração quer cuspir. De novo e de novo. Você não fala mais
com ela. Você não telefona. Você não manda mensagens. Você não tem nenhum
motivo ou pretexto. A tosse é a paixão sufocada. A paixão por dentro sem voz,
sem comunicação, sem nada.
Ela
tampouco imagina que seu coração está cuspindo. Seu coração cospe. Intervalos
longos em que o mundo para e desaparece. Seu coração resmunga. Seu coração não
é seu, ainda é dela, até quando?