Pessimildo x Otimildo: por que o
governo dá boas razões para temer o pior
Daniel
Jelin
Na
tentativa de neutralizar os críticos, campanha petista lança cruzada pelo
pensamento positivo. Em entrevista ao site de VEJA, o filósofo inglês Roger
Scruton, autor de "As Vantagens do Pessimismo", analisa os riscos do
"otimismo inescrupuloso"
Pessimildo,
o ranheta da propaganda petista
Pessimildo,
o ranheta da propaganda petista (Reprodução/VEJA)
Um
ranheta contumaz que torce para que o Brasil dê errado. É essa a imagem que a
candidata Dilma Rousseff tem de seus críticos, a julgar pela cruzada contra o
pensamento negativo que o PT levou ao horário eleitoral essa semana. A campanha
é estrelada por um boneco batizado Pessimildo, de sobrancelhas grossas, olhos
cansados e queixo protuberante — parece uma mistura do Seu Saraiva, o
personagem de Francisco Milani no Zorra Total; com Statler, o crítico rabugento
dos Muppets;
Carl,
o viúvo solitário de Up - Altas Aventuras; e Gru, o vilão de Meu Malvado
Favorito. No vídeo levado ao ar, Pessimildo passa a noite em claro "para
ver o pior acontecer" e se diverte com a perspectiva de que o desemprego
cresça no Brasil — o que, hoje, é bem mais do que uma perspectiva. Um narrador
de tom jovial faz pouco caso do fantoche: "Vai dormir, vai'.
Pessimildo
é uma caricatura, mas bastante reveladora das obsessões da campanha petista.
Desde o início da corrida eleitoral, a presidente Dilma Rousseff tem atacado os
"nossos pessimistas", que "desistem antes de começar". Para
ela, como para seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva,
"pessimismo" se opõe a valores como "verdade",
"vitória" e "progresso". "Pense positivo, pense Dilma
(sic)", recomenda a campanha petista, à maneira dos manuais de autoajuda.
As
armadilhas deste otimismo desmedido são analisadas em The Uses of Pessimism
("As Vantagens do Pessimismo", em edição publicada em Portugal), que
o filósofo inglês Roger Scruton lançou em 2010.
Não
se trata de defender a melancolia, a desesperança, a indiferença ou o
ressentimento — o livro não tem nada de sombrio. Seu alvo é o "otimismo
inescrupuloso". E, com frequência, o Otimildo da campanha petista é aquele
que constrói sua mensagem com base em falácias, exageros, ilusões — ou na pura
e simples manipulação da verdade e dos números.
"Pessoas
verdadeiramente alegres, que amam a vida e são gratas por esta dádiva, têm
grande necessidade do pessimismo — em doses pequenas o bastante para que sejam
digeríveis", escreve Scruton