15
de setembro de 2014 | N° 17923
ARTIGO
- PAULO BROSSARD]*
CORRUPÇÃO
DESLAVADA
No
depoimento prestado em “delação premiada”, pela qual pretendeu reduzir sua pena
e deixar a prisão, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras citou 32
parlamentares federais, um governador, envolveu cinco partidos, incluindo os
dois maiores, como supostos beneficiários de inédito esquema de propinas,
pactuado até bem pouco, com a maior empresa da América do Sul. Mercê de
convenção, os comanditários participavam de 3% do valor de contratos celebrados
pelo referido serviço da Petrobras.
Falando
claramente, em todas as aquisições efetuadas, algumas pessoas eminentes, a
começar pelo presidente do Senado, teriam passado a auferir os 3% do valor das
compras. Há muitas variedades forjadas pela astúcia humana, mas esta parece
inédita. A que título 80 pessoas referidas são contempladas com os 3% em tela?
Não
há precedente na administração pública. Em verdade, na linguagem legal do
Direito Penal, não se encontrará o emprego do adjetivo malfeito como sinônimo
de delito. No entanto, a presidente da República, aliás, em campanha por sua
reeleição, parece confundir o substantivo crime com o adjetivo “malfeito”, como
se fossem sinônimos. Logo após a revelação do fato, em manchete um dos nossos
maiores matutinos estampou palavras suas “nunca soube dos ‘malfeitos’ da
Petrobras” (sic).
Deliberadamente
ou não, mediante a espúria e pretendida equivalência entre os dois vocábulos,
fosse na tentativa de dar-lhe foros de cidade, o que, aliás, seria inaceitável,
ou outra suposta exegese, a enxertia se revelou inepta. No entanto, saliente-se
que, na tradição do Direito Público, em qualquer dos seus ramos, jamais se
admitiu que o substantivo “delito” fosse tomado como sinônimo do adjetivo
“malfeito” e vice-versa, o que em linguagem quer dizer mal concebido ou mal
executado.
Afinal
deslocar 3% de uma despesa estatal para a algibeira de 80 beneficiários de alta
expressão seria inconcebível qualquer que fosse o ângulo de apreciação.
Um
fato é inequívoco, nunca antes na história deste país, a corrupção foi tão
deslavada como nos últimos 12 anos.
*Jurista,
ministro aposentado do STF