20
de setembro de 2014 | N° 17928
NÍLSON
SOUZA
O MINISTÉRIO DA
VERDADE
Esse
pessoal que anda mexendo na Wikipédia, a enciclopédia virtual da internet, para
alterar biografias alheias e desgastar inimigos políticos também está
reatualizando a genial fábula de George Orwell, 1984. Passaram-se 30 anos do
ponto futuro previsto pelo escritor britânico e ainda tem gente caindo na
tentação totalitária de reescrever a História de acordo com suas convicções e
ideologias. Agora ficou até mais fácil fazer isso, basta dominar a tecnologia
da postagem eletrônica.
Só
para lembrar – até porque os leitores de textos longos estão escasseando nestes
tempos digitais –, Orwell projetou uma sociedade totalmente controlada pelo
Estado e pelo partido ocupante do poder, que manipula informações, vigia os
cidadãos e reprime o pensamento divergente. A administração do superestado
imaginado pelo romancista tem quatro pastas emblemáticas: o Ministério da
Verdade, o Ministério do Amor, o Ministério da Fartura e o Ministério da Paz –
todas promovendo exatamente o oposto do que seus belos nomes sugerem.
O
Ministério da Verdade falsifica documentos e adultera a História, garantindo
assim a infalibilidade do partido e do Grande Irmão que a todos governa. O
Ministério da Paz promove a guerra, como forma de manter a população mobilizada
por uma causa comum.
O
Ministério da Fartura é responsável pela fome e trata de divulgar supersafras
inexistentes, para que a população pense que o país vai cada vez melhor. Por
fim, o Ministério do Amor, que espiona e controla a população, julga, tortura e
faz lavagens cerebrais de quem ousa discordar das orientações do partido.
Em
tempo de guerra (e de campanha eleitoral), mentira é como terra. Os próprios
candidatos admitem a estratégia de “desconstruir” adversários (parece a
Novilíngua do romance), mas o esperável é que o façam frente a frente, de modo
transparente, dando ao oponente a chance de se defender. Alterar
arbitrariamente biografias e registros históricos é coisa de Polícia do
Pensamento – outra alegoria tristemente real se considerarmos o patrulhamento
via internet.