CLÓVIS
ROSSI
Sobre o diálogo de
Dilma
O EI
não é um interlocutor, mas atuar sobre os jovens muçulmanos pode ser o caminho
mais promissor
Depois
de decodificada pelo chanceler Luiz Alberto Figueiredo, faz sentido a posição
da presidente Dilma Rousseff a respeito da crise criada pelo EI (Estado
Islâmico).
A
primeira impressão --a de que ela sugeria o diálogo com esses fanáticos-- seria
realmente uma tolice imensa.
Não
há como dialogar com fanáticos. Mesmo que não tivessem decapitado ninguém,
prova-o o fato de que, ao abrirem o ano letivo nos territórios que controlam,
riscaram do currículo as cadeiras de arte, música, história, geografia e
literatura, coisas impuras para uma visão fundamentalista.
Mas
se a presidente de fato quis dizer que é necessário "o diálogo político na
comunidade internacional, e não usar a força como solução inicial", como
traduziu o chanceler, aí poderia eventualmente funcionar.
Até
porque o presidente Barack Obama errou ao afirmar que um grupo como o EI só
entende uma linguagem, exatamente a da força, criticada por Dilma.
Errado.
Nem à força esse tipo de fanáticos se dobra, como dá prova o Afeganistão. Os
Estados Unidos usaram a força --e, na ocasião, devidamente autorizados pelas
Nações Unidas--, tiraram do poder o Taleban, que é uma versão do EI, e, após
anos de ocupação e milhares de mortes, este continua atuante.
Talvez
--e é importante grifar talvez-- o diálogo na comunidade internacional
permitisse ouvir a voz do Irã, ele também vítima do uso da força pelos Estados
Unidos, na forma de sanções, e governado pelos radicais de uma facção do
islamismo, embora oposta à do EI (são xiitas, não sunitas). Hasan Rowhani, o
presidente atual que tem dado reiteradas demonstrações de bom senso, disse que
a solução para o problema do EI deveria ser encontrada pelos próprios
muçulmanos.
Parte
da constatação, correta, de que as intervenções ocidentais no mundo muçulmano
têm sido muito mais parte do problema que da solução. A lacuna na proposta
iraniana é que os líderes muçulmanos também têm sido mais problema que solução,
do que dão prova o xiita iraquiano Nuri Al-Maliki, recém-apeado do poder, e o
alauíta sírio Bashar Al-Assad, promotor de uma carnificina que torna pálidos os
crimes do EI.
Não
tem solução, então? Fácil, não tem, não. Mas talvez possa funcionar a conquista
de mentes e corações muçulmanos.
No
Reino Unido e agora na França está em curso uma campanha pelas redes sociais
sob o hashtag "NotinMyName", a maneira encontrada por jovens
muçulmanos para dizer que não se sentem representados pelos fanáticos.
É
uma campanha dirigida pela "Fundação Mudança Ativa", que combate
todas as formas de extremismo. Hanif Qadir, presidente do grupo, diz "os
jovens muçulmanos britânicos estão fartos da propaganda do ódio do Estado
Islâmico e sua proliferação nas redes sociais".
Parece
lógico supor que os jovens muçulmanos das regiões sob controle do EI estejam
ainda mais fartos, porque são vítimas não da propaganda, mas das ações
violentas do grupo. Trabalhar com uns e outros pode, pois, ser um caminho.
crossi@uol.com.br