quarta-feira, 3 de setembro de 2014


03 de setembro de 2014 | N° 17911
MOISÉS MENDES

Quem mata o porco?

Uma história de bicho para esta época de Expointer. O açoriano Joaquim de Medeiros Melo saiu da Freguesia de São Brás, na ilha de São Miguel, com a mulher e sete filhos, e veio para o Brasil em 1961. Já era homem maduro, de 50 anos, e se instalou na Chácara das Pedras, na zona leste de Porto Alegre.

Itamar Melo, um dos grandes repórteres aqui de ZH, conta com orgulho que o avô Joaquim sabia matar porco. Tem gente que se exibe porque o avô toca gaita de boca ou é capaz de esculpir rostos em palitos de fósforo ou porque declama Os Lusíadas.

Itamar sabe que o avô fazia o que poucos dominam. No início deste ano, esteve na Freguesia de São Brás. Encantou-se com a hospitalidade dos parentes e viu onde o avô matava porcos.

Matar porco não é para qualquer um. Exige tanta perícia que, no Alegrete, quando alguém garganteia muito, mas todos sabem que não faz direito o que propagandeia, se diz que “este não mata o porco”. Ou, se faz o serviço pela metade, pode até matar o porco, mas aí se diz que “mata o porco, mas não tira a banha”.

O avô do Itamar fazia o serviço completo. Só que o negócio hoje é ensinar a matar o porco, qualquer porco, em qualquer área, principalmente às vésperas das eleições. Você não precisa matar o porco, precisa convencer os outros de que sabe ensinar a matar.

Temos especialistas hoje em gestão de matança de porco, no sentido mais amplo. Eles só ficam na volta, dando conselhos, alcançam a faca de vez em quando, passam a faca na chaira, mas não metem a mão na massa, ou no porco. Tem gente que nunca matou um porco na vida, mas escreve longos ensaios sobre o assunto. São teóricos da matança de porco.

Tem também aquele que já matou, mas era um fracasso carneando porco e agora virou palpiteiro. Ele mata, na teoria, qualquer porco, de qualquer raça.

A situação econômica, por exemplo, é um porco sempre pronto a desafiar palpiteiros. Cada vez tem mais gente capaz de arrumar a economia do Brasil, só olhando de fora.

É um tipo de gente que entra em florada agora, às vésperas da eleição. Eles estão sempre grudados aos marqueteiros e a alguns interésses, porque não há ninguém sem algum interésse.

Muitos palpiteiros já estiveram diante do porco, mas titubearam e agora tentam vender seus conhecimentos. Tudo é grandioso nas teses do palpiteiro que já teve a chance de fazer o serviço e deixou a chaira cair no chão, enquanto o porco fugia.

Para os palpiteiros, uma ideia alheia nunca é uma ideia pronta, mas algo a ser destroçado, triturado ou, em último caso, aperfeiçoado. Eles sempre vão melhorar o que os outros pensam, inclusive o que você está pensando agora.

Encerro por aqui. Tenho dois porcos me esperando. Ultimamente, me dedico ao que sei fazer. Vou mostrar a uma turma como carnear por um método novo, sem berreiro do porco. Agora, ensino a matar porcos.

Mas asseguro que já matei porcos, e dos grandes. Não tenho as provas agora aqui comigo, mas o povo do Caverá, lá no Alegrete, sabe bem do que eu estou falando. Era isso. Tragam os porcos.



legislativa, os 20 Estados que formam as regiões Norte (7), Nordeste (9) e Centro-Oeste (4), embora reunindo menos da metade da população brasileira (43%), monopolizam 74% das 81 cadeiras do Senado Federal.

Na Câmara dos Deputados, a situação não é outra quando as mesmas bancadas controlam 50,1% das cadeiras (257), enquanto que os deputados oriundos das sete unidades que formam as regiões Sul (3) e Sudeste (4), as mais industrializadas e populosas do país (IBGE 2010), preenchem 49,9% (256).

Também a maior parte dos eleitores está localizada na Região Sudeste, que concentra 43,44%, somando 62.041.794 pessoas (TSE 2014), e o maior colégio eleitoral se localiza no Estado de São Paulo, com 31.998.432 eleitores (TSE 2014).

Tanto a sobrerrepresentação daquelas primeiras quanto a sub-representação das demais foram introduzidas pelo Código Eleitoral de 1932 e incrementadas a partir da Constituição Federal de 1934. É indisfarçável que essas normas, reproduzindo os desmandos e despotismos vigentes à época, sacramentaram uma federação mutilada e parlamentarmente deformada, onde a representação de várias unidades goza de um peso extra refletido em desigualdades na formação de comissões, votações etc.

De lá para cá, a situação se consolidou. Aliás, conforme recentemente lembrou o jornalista e escritor Laurentino Gomes, tais distorções são fortemente enraizadas e têm origem no Império, quando “os conservadores tinham representação mais forte nas províncias do Nordeste e, em geral, favoreciam a centralização do poder imperial, enquanto os liberais representavam as províncias do Sul e do Sudeste – especialmente São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul – e defendiam uma maior descentralização em favor da economia regional” (2013, p. 106).

O Brasil estabeleceu um federalismo ilusório, assentado numa representação congressual fictícia na qual a maioria da população elege menos representantes do que deveria e a minoria elege além do que deveria. Portanto, sendo as configurações políticas desnaturadas pela desproporcionalidade, a representação dos Estados perante o Parlamento não é autêntica.


Advogado - ANTÔNIO AUGUSTO MAYER DOS SANTOS