19 de fevereiro de 2015
| N° 18078
L. F. VERISSIMO
O Contexto Maior
Recomenda-se a desiludidos com a
atualidade em geral e com o PT em particular procurar refúgio no Contexto
Maior. O Contexto Maior não absolve, exatamente, o contexto imediato, a triste
realidade de revelações e escândalos de todos os dias, mas consola. Nossa
inspiração deve ser o historiador francês Fernand Braudel, que – principalmente
no seu monumental estudo sobre as civilizações do Mediterrâneo – ensinou que
para se entender a História é preciso concentrar-se no que ele chamava de “la
longue durée”.
Que é outro nome para o Contexto
Maior. Braudel partia do particular e do individual para o social e daí para o
nacional e o generacional, se é que existe a palavra, e na sua história da
região o indivíduo e seu cotidiano eram reduzidos a ”poeira” (palavra dele
também, que incluía até papas e reis) em contraste com a “longue durée”, o
longo prazo da história verdadeira. Assim, na sua obra se encontram as minúcias
da vida diária nos países do Mediterrâneo mas compreendidas “sub specie
aeternitatis”, do ponto de vista da eternidade, que é o Contexto Maior pedante.
Do ponto de vista da eternidade,
nada do que está sendo revelado, em capítulos diários, sobre o propinato na
Petrobras e os partidos políticos que beneficiou deixa de ser grave, mas é
impossível não ver o cerco à estatal do petróleo no Contexto Maior da velha
guerra pelo seu controle, que já dura quase 70 anos, desde que a Petrobras
venceu a primeira batalha, a que lhe permitiu simplesmente existir, quando
diziam que nunca se encontraria petróleo no Brasil.
Mais do que em qualquer outra
frente de confronto entre conservadores e progressistas e direita e esquerda no
Brasil, na luta pela Petrobras, e por tudo o que ela simboliza além da
exploração de uma riqueza nacional, se definem os lados com nitidez. A punição
dos responsáveis pelos desvios que enfraqueceram a estatal deve ser exemplar e
todos os partidos beneficiados que se expliquem como puderem, mas que se pense
sempre no Contexto Maior, no qual a sobrevivência da estatal como estatal,
purgada pelo escândalo, é vital.
Fernand Braudel viveu e lecionou
no Brasil. Não conheço nenhum texto dele sobre sua experiência brasileira.
Seria interessante saber como ele descreveria, ou preveria, hoje, a “longue
durée” da nossa história. O que significaria, na sua avaliação, o longo dia no
poder do PT? O Contexto Maior tudo perdoaria ou tudo justificaria? Enfim, o
Contexto Maior de todos é o Universo, que, no fim, engole todos os
significados. O que também não é um consolo.