terça-feira, 30 de julho de 2013


30 de julho de 2013 | N° 17507
PAULO SANT’ANA

Ainda o leite envenenado

Leio que o preço do leite aumentou para todos nós depois que flagraram alguns distribuidores adicionando formol ao produto.

Então agora ficamos sabendo que o preço do leite envenenado era mais barato para nós.

Vejam a sinuca em que nos metemos: ou pagamos mais caro para o novo leite, teoricamente puro, ou pagamos mais barato pelo leite antigo e envenenado?

Resta saber se o leite antigo era envenenado por ser mais barato ou se era mais barato porque era envenenado. E às vezes eu desconfio que prefiro leite envenenado mais barato a leite puro com preço aumentado.

E qual foi a sorte daqueles patifes que envenenavam o leite e lucravam fortunas com o envenenamento?Devem estar impunes e podem ter-se corrigido. Neste caso, agora estão lucrando mais com o novo leite teoricamente genuíno.

Ou seja, na hipótese anterior, os patifes lucravam adicionando formol ao leite envenenado, mas agora passaram a lucrar com o novo leite de preço aumentado. Em todas as hipóteses, ferra-se o consumidor, já repararam?

E locupletam-se os fornecedores e distribuidores.

Esses dias vi uma pessoa num bar do Centro perguntar ao atendente: “O senhor não poderia me servir uma taça de café com leite antigo, confesso-lhe que estou com saudade do formol”.

E quem necessitar comprar formol numa farmácia não corre o risco do produto estar misturado com leite? Alguém disse que no fim de toda aquela novela da falsificação do leite quem iria ser considerada culpada era a vaca.

Sempre pensei que a vaca, coitada, só produz leite na suposição de que seu produto vá alimentar o seu terneiro e não os humanos.

Por sinal, depois que o leite brota da teta da vaca, vejo agora que só o terneiro não corre risco de tomar leite misturado com formol. Depois que o leite é apoderado pelo estancieiro, desde a fazenda, passando pela usina de tratamento e sendo transportado por caminhões, o leite contém o risco de ser falsificado.

Só quem não corre risco, repito, portanto, é o terneiro, que, ao apojar na teta da vaca o leite que o sustenta, tem o privilégio único e exclusivo de beber leite puro, genuíno, sem contato com a mão humana, que sempre carrega o potencial da fraude.

Se não fosse pela possibilidade quase certa de ser no futuro eliminado num matadouro, eu preferiria ter nascido terneiro. Beberia leite sem formol, quentinho, saído diretamente da teta da vaca, privilégio também exercido pelos bebês que mamam nas mamicas de suas mães leite puro, sem que tenham de suportar o amargo aumento de preço do produto que sofremos atualmente nós, os consumidores em geral.

O corre-me também agora que eu nunca deveria ter deixado de ser bebê. Vida mansa. Porque depois que me lancei à infância, à maturidade e à velhice, só arranjei complicações.