sábado, 31 de julho de 2021


31 DE JULHO DE 2021
FLÁVIO TAVARES

CAFÉ COM FRIO

O título talvez leve a pensar que sugiro tomar mais café pelo frio, quando - de fato - busco lembrar como o clima gelado afetou nossos cafezais, do sudeste de Minas ao Paraná, no Sul, e, mais ainda, em São Paulo. Antes, foi a seca, agora a geada, num desastre que, em escala global, foi produzido pela ação ou inércia de todos nós.

A crise climática gera todo o queixume de agora, em que (aqui no Sul) nem as grossas roupas de lã, umas sobre as outras, disfarçam o frio. As mudanças climáticas, porém, são obra humana e já estamos em crise profunda. No atual verão do Hemisfério Norte, a Sibéria (região de gelados invernos) vive um calor sufocante, jamais visto por lá, onde, antes, a temperatura nunca ultrapassava 25 graus.

Na Europa Central e na China, chuvas arrasam cidades num extemporâneo dilúvio. A urbanização sem limites é a causa principal, especialmente na China, onde a edificação impermeabiliza o antigo solo agrícola e as minas de carvão infestam o ar.

Aqui, a geada faz os cafeicultores aplicarem nitrato de potássio nos cafezais para reduzir o ponto de congelamento da seiva. Isto aumenta a resistência das plantas, mas há, também, a malvada contrapartida: o nitrato de potássio pode acarretar problemas à saúde humana, como irritar a pele e mucosas ou até os olhos. E não apenas durante a aplicação em si, mas, igualmente, pode deixar resíduos nos grãos que, logo, passam ao café que bebemos.

Como se não bastasse o horror da covid-19, até o café nos leva àquele "se correr o bicho pega, se ficar o bicho come". Tudo por conta do erro grotesco de continuarmos a destruir a natureza, como se o planeta fosse um estorvo.

Agora, forma-se geada também sobre a política, secando a seiva que devia alimentar os governantes. O senador Ciro Nogueira, do PP do Piauí, que Bolsonaro escolheu como novo ministro-chefe da Casa Civil, responde na Justiça a cinco inquéritos por suborno e propinas milionárias. No dia em que assumiu o estratégico posto de coordenador do governo, a Receita Federal o citou como suspeito de sonegar milhões no Imposto de Renda.

Na posse, Bolsonaro disse que entregava "a alma do governo" a Ciro Nogueira, que dirige o PP, o partido mais implicado nas fraudes da Lava-Jato.

O novo dono da "alma do governo" é íntimo perene do poder. Na era Lula da Silva e Dilma Rousseff, foi fanático defensor de ambos e Lula foi seu semideus.

Com geada, neve ou seca, tudo serve ao novo dono da "alma do governo". Até café frio.

FLÁVIO TAVARES

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