01
de setembro de 2014 | N° 17909
L.
F. VERISSIMO
Maravilha!
Pode-se
parafrasear Winston Churchill e dizer da democracia o mesmo que se diz da
velhice, que por mais lamentável que seja é melhor do que sua alternativa. A
única alternativa para a velhice é a morte. Já as alternativas para a
democracia são várias, uma pior do que a outra. É bom lembrá-las sempre,
principalmente no horário político, quando sua irritação com a propaganda que
atrasa a novela pode levá-lo a preferir outra coisa.
Resista.
Engula sua impaciência com a retórica eleitoral que você sabe que é mentirosa,
com o debate vazio, com os boatos maldosos e os golpes baixos, com o desfile de
candidatos que variam do patético ao ridículo... Diante de tudo isso, em vez de
“que chateação” pense “que maravilha!”. É a democracia em ação, com seus
grotescos e tudo. Saboreie, saboreie.
O
processo, incrivelmente, se autodepura, sobrevive aos seus absurdos e dá certo.
Ou dá errado, mas pelo menos de erro em erro vamos ganhando a prática. Mesmo o
que impacienta é aproveitável, e votos inconsequentes acabam consequentes. O
Tiririca não sei, mas o Romário não deu um bom deputado? Vocações políticas às
vezes aparecem em quem menos se espera.
E é
melhor o cara poder dizer a bobagem que quiser na TV do que viver num país em
que é obrigado a cuidar o que diz. Melhor ele pedir voto porque é torcedor do
Flamengo ou bom filho do que ter sua perspectiva de vida decidida numa ordem do
dia de quartel. Melhor você ser manipulado por marqueteiros políticos, com
direito a desacreditá-los, do que pela propaganda oficial e incontestável de um
poder ditatorial. Hoje os candidatos à Presidência medem suas ideias e
diferenças livremente, e todos são iguais perante o William Bonner.
Certo,
às vezes as alternativas para a democracia parecem tentadoras. Ah, bons tempos
em que o colégio eleitoral era minimalista: tinha um eleitor só. O general na
Presidência escolhia o general que o sucederia e ninguém pedia o nosso palpite.
Era um processo rápido a ascético que não sujava as ruas. A escolha do poder
nas monarquias absolutas também é simples e sumária, e o eleitor do rei também
é um só, Deus, que também não se interessa pela nossa opinião.
Ou
podemos nos imaginar na Roma de Cícero, governados por uma casta de nobres e
filósofos, sem nenhuma obrigação cívica salvo a de aplaudi-los no fórum, só
cuidando para não parecer ironia.
A
democracia é melhor. Mesmo que, como no caso do Brasil das alianças esquisitas,
os partidos coligados em disputa lembrem uma salada mista e ninguém saiba ao
certo quem representa o quê. E onde, com o poder econômico mandando e
desmandando, a atividade política termine parecendo apenas uma pantomima. Não
importa, não deixa de ser – comparada com o que já foi – uma maravilha.