Uma espera há tempo demais
Familiares e amigos das vítimas do incêndio da boate Kiss esperam há tempo demais. Merecem desfechos que signifiquem o encerramento de ciclos, mesmo conscientes de que a dor da perda nunca será superada por inteiro. Mais de 11 anos após a tragédia que deixou 242 mortos e 636 feridos, aguardam principalmente por justiça.
O início da demolição do prédio da Kiss, na quarta-feira, em Santa Maria, é um destes marcos. O local, mantido em pé também por questões relacionadas às investigações sobre a fatídica madrugada de 27 de janeiro de 2013, era uma espécie de símbolo do desconsolo pelo vazio deixado em tantos lares com a partida precoce de centenas de jovens. Um memorial às vítimas será construído no espaço. O lugar impregnado de lembranças doloridas se transformará em outro, de homenagens, preservação da memória e de reforço à importância da prevenção a incêndios.
A expectativa é de que a construção do memorial leve oito meses. A intenção, como se sabe, não é nova. Um concurso para escolher o melhor projeto foi concluído em 2018, vencido pelo arquiteto paulista Felipe Zene Motta, que concorreu com outras 120 ideias. Mas a demolição vinha sendo adiada pela prefeitura de Santa Maria, em atenção a pedidos dos familiares, que consideravam mais adequado esperar o fim do julgamento dos réus. O memorial, portanto, também foi vítima da lentidão da Justiça.
Está nas mãos da cúpula do Judiciário brasileiro uma satisfação aos familiares dos que padeceram no incêndio da Kiss. Aguarda-se que não passe deste ano um ponto final no caso.
No final de 2021, o júri mais rumoroso e demorado da história do Estado foi encerrado com a condenação dos quatro réus por homicídio com dolo eventual, com penas de oito a 12 anos de prisão. Mas foi anulado em agosto do ano seguinte pela 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a anulação e chegou a marcar um novo júri para de fevereiro deste ano. Mas o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), atendeu a pedido do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) e suspendeu o novo julgamento. Um recurso do Ministério Público Federal (MPF) no STF busca reconhecer a validade do júri de 2021.
Informações de bastidores indicavam que a Corte estava inclinada a manter as condenações, com uma definição ainda no primeiro semestre de 2024, o que não ocorreu. Espera-se, agora, que o caso seja decidido pelo Supremo no retorno do recesso de meio de ano.
Hoje, familiares das vítimas da Kiss estarão em uma audiência na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Juntos a parentes de mortos de outros quatro episódios traumáticos registrados no país nos últimos anos, como o rompimento da barragem de Brumadinho (MG), em 2019, vão reclamar por justiça.
A impunidade agrava a dor da tragédia. A justiça é o único consolo possível. _
Opinião do leitor
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